“A luta não é de uma, é de todas. E de todos”, com esse bordão podemos resumir a campanha “Advocacia Sem Assédio”, que foi lançada nesta quarta-feira (27/04) no auditório da Seccional do Distrito Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/DF). O evento aconteceu presencialmente e com transmissão pelo canal oficial do Youtube da OAB/DF (clique aqui para rever). Uma verdadeira rede em apoio à ação foi mobilizada para combater o assédio moral e sexual.
O presidente da OAB/DF, Délio Lins e Silva Jr., lembrou que a cartilha utilizada na campanha nacional, e que hoje já é utilizada por outros órgãos federais e estaduais, além de estar traduzida para o inglês e espanhol, foi gestada e criada na Seccional do Distrito Federal. “Temos muito orgulho por esse trabalho iniciado aqui em Brasília, em 2019, e que hoje se espalha pelo Brasil. É um tema importantíssimo e do qual não podemos mais admitir retrocessos, todas e todos tem que lutar para que o assédio sexual e moral seja extirpado de nossa sociedade”, disse Délio.
Depoimentos
A vice-presidente da OAB/DF, Lenda Tariana, lembrou que esse é um trabalho que deve seguir de guia para o presente, como meta para o futuro, mas também como um tributo a todas as mulheres que lutaram por respeito e dignidade.
“Queria chamá-los a uma reflexão, pois hoje temos paridade na gestão da Ordem, e essa campanha só é possível graças a isso. Antes quem investigava e julgava esses casos eram homens julgando homens, como se fossem casos deles contra nós mulheres. O assédio no ambiente de trabalho não é algo novo, a novidade é esse enfrentamento. Vivemos um momento de transição, estamos aqui para dar voz as mulheres do passado sofreram muito e não tinham voz, por todas nós, pois todas aqui já sofreram alguma forma de assédio, e por aquelas que estão chegando e devem receber um ambiente melhor.”
Conforme a presidente da Comissão Nacional da Mulher Advogada (CNMA), Cristiane Damasceno, não há nada mais constrangedor para uma mulher do que ser assediada em seu ambiente de trabalho.
“Gosto de dizer que para tudo na vida existe um tempo certo para as coisas acontecerem, e atualmente temos um terreno fértil para enfrentarmos a violência contra a mulher. E vejam, esse é o tema mais espinhoso que podemos trazer para dentro de nossa casa, pois ele acontece muitas vezes entre nossos pares, então para encamparmos essa temática da violência sexual e moral contra as mulheres, precisamos lutar contra muitas coisas que são, muitas vezes, aceitas socialmente. Mas logo após lançarmos a ação percebemos sua urgência e rápida aceitação, e hoje ela é o segundo tema mais visualizado em nossas redes sociais e o tema mais discutido em nossas seccionais e subseções. Então queria dizer que estar aqui com vocês hoje lançando o Advocacia Sem Assédio é mais que uma campanha, é um propósito de vida, pois deixaremos um legado e um mundo melhor para as mulheres que virão depois de nós, com mulheres com mais liberdade, que possam denunciar esses abusos e que tenham mais condições de assumirem postos de liderança e de poder. A campanha tem esse cunho educativo, mas nossa meta é mudar isso dentro de nossa legislação, esse é o nosso propósito.”
A presidente da Comissão da Mulher Advogada da OAB/DF, Nildete Santana, as mulheres ainda são vistas sobre o prisma do machismo estrutural.
“Este é um tema que precisamos primeiramente identificar, depois admitir que ele existe e só então combatê-lo. A gente primeiro sente um incômodo, sabe que aquilo que está acontecendo não está certo, mas ficamos sem saber o que aconteceu. E só então nos damos conta que aquilo foi um assédio. Essa violência sempre existiu, mas só a partir dos anos 1990 passou a ser estudado, para vocês verem como demoramos para admitir que ele existia. Estudos mostram que cerca de 90% do assédio é cometido por homens, e nas carreiras jurídicas somos muito assediadas. E por isso precisamos denunciar, pois muitas vezes o assediador não percebe que está assediando, então ele também precisa ser conscientizado”, afirmou Nildete, que terminou narrando um caso pessoal, onde sofreu assédio de um antigo empregador ainda na adolescência antes de cursar Direito, e que até hoje lhe causam lembranças dolorosas.
A vice-presidente da CAADF, Maria Bernadete Teixeira, lembrou que o assédio pode se dar de muitas formas, tanto física, sexual ou psicológica.
“Quando viemos de um ambiente frágil, desconstruído, precisamos dessa proteção e acolhimento que está nos sendo oferecido aqui hoje. Mas como minhas colegas aqui já falaram, todas aqui já sofreram algum tipo de assédio, e muitas vezes temos dificuldades de saber que aquilo que estamos sofrendo é uma violência. Por isso essa campanha deve ser encampada por todas e todos com muita força, pois muitas vezes quem vê uma advogada segura de si, que enfrenta os problemas como se fosse uma rocha, não sabe que por dentro ela está sofrendo com essas situações. Antes nossas mães não tinham onde buscar esse amparo, e agora temos meios para lutar e denunciar contra essa violência que nós mulheres sofremos diariamente.”
União nacional contra o assédio
A OAB e suas seccionais entendem que já não há mais espaço para omissão ou silêncio em casos de assédio moral e sexual contra mulheres e propõe uma caminhada conjunta no enfretamento a essa violência. Uma pesquisa da Internacional Bar Association (IBA) apontou ainda que, em 57% dos casos de bullying, os incidentes não foram denunciados. Esse percentual amplia-se para 75% nos casos de assédio sexual. Já 65% das profissionais vítimas de bullying ou assédio pensaram em abandonar o emprego. No Brasil, 23% dos entrevistados dizem já ter sofrido algum tipo de assédio sexual e 51% revelaram já ter sido vítima de bullying.
Com a campanha, a Ordem abre espaço e oferece todo o suporte para que advogadas e profissionais do Direito falem sobre os episódios de assédio, sem que haja medo de retaliações, e ainda incentiva que os crimes sejam denunciados. As denúncias podem ser direcionadas para o endereço www.advsemassedio.org.br.
Entenda o que é assédio moral e sexual
O assédio moral ou sexual é um tipo de violência que ocorre no ambiente de trabalho, é um comportamento complexo que se manifesta de diversas formas, diretas e indiretas, de intensidade e gravidade variada, isolada ou continuada, dificilmente reconhecido e assumido pela sociedade, e que afeta majoritariamente as mulheres.
A cartilha da campanha Advocacia Sem Assédio traz, de forma simples e objetiva, definições, dispositivos legais, exemplos práticos onde são indicadas situações que configuram assédio moral e assédio sexual, elencando as causas presumíveis e consequências desse tipo de comportamento.
A presidente da CNMA afirma que “é necessário prevenir e combater as condutas reconhecidas como assédio, obstando o seu surgimento e erradicando qualquer atitude que possa ser considerada constitutiva do assédio no local de trabalho, a fim de garantir a proteção dos direitos fundamentais da pessoa, reconhecidos constitucionalmente”, diz Cristiane Damasceno.
Pesquisa global da Internacional Bar Association (IBA) sobre assédio sexual e moral nas profissões jurídicas revelou que uma em cada três advogadas já foi assediada sexualmente. Uma em cada duas mulheres entrevistadas já sofreu assédio moral.
Clique aqui para conhecer a cartilha e baixá-la.
Texto: Euclides Bitelo – Comunicação OAB/DF
Fotos: Roberto Rodrigues