Wambier critica o excesso de demandas repetitivas na Justiça

O jurista e professor Luiz Rodrigues Wambier apontou “a presença exagerada da Fazenda Pública em juízo” como uma das principais causas do volume excessivo de iguais pedidos na Justiça brasileira. Em aula magna na OAB/DF, nesta quarta-feira (8/5), ele defendeu o Índice de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR) como uma das inovações mais importantes do novo Código de Processo Civil para evitar que causas idênticas terminem com decisões judiciais distintas.

Segundo Wambier, aproximadamente 65% dos recursos especiais e das ações de competências originárias que tramitam no Superior Tribunal de Justiça (STJ) envolvem a Fazenda Pública. “Ela é a grande usuária do sistema judicial brasileiro e isso gera centenas de milhares de demandas repetitivas. Ou ela é a parte interessada ou ela é a causadora do conflito entre os particulares”, disse o jurista, no encontro organizado pela Escola Superior de Advocacia do Distrito Federal (ESA/DF), órgão da OAB/DF. “É uma distorção”, criticou.

Wambier enumerou algumas das consequências das demandas repetitivas que julga mais nocivas ao sistema judiciário, como a insegurança e a instabilidade jurídicas. “Não podemos nos conformar com questões de Direito idênticas que terminam com soluções diferentes. A segurança e a estabilidade jurídicas são elementos intrínsecos à democracia”, afirmou o jurista, que advoga há 41 anos, especialmente nos tribunais superiores.

João e José
Luiz Rodrigues Wambier apresentou um exemplo simples para explicar a questão. “Se temos dois sujeitos, João e José, que trabalham na mesma fábrica, têm o mesmo salário, a mesma função e a mesma contribuição. Eles se aposentam e, depois de algum tempo, procuram a Justiça para reivindicar uma determinada correção de aposentadoria. Os dois entram então com a mesma ação individualmente. A de João cai numa vara judiciária, enquanto a de José vai para outra. João recebe uma sentença favorável, José, não”, concluiu.

“Como legitimar o sistema desta forma?”, indagou o jurista à plateia de mais de 100 ouvintes no auditório da OAB/DF. “Como justificar uma distorção desta para a sociedade que pretende confiar no sistema?”, continuou. “Se sou leigo no Direito, como vou entender que questões de direito idênticas tenham soluções distintas?” Para ele, o excessivo volume de processos favorece o problema e se firma sobre o mito da ampla liberdade do juiz. “É um mito”, disse.

Morosidade
Além das decisões distintas em processos idênticos, Wambier citou a morosidade dos processos com outra consequência danosa das demandas repetitivas. “Hoje uma apelação dura em média 86 dias para ser julgada no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, por exemplo. Há alguns anos, essa média era de aproximadamente 900 dias, dez vezes mais”, citou.

O jurista criticou também o excesso de jurisprudências no Brasil. “A jurisprudência deve ter tempo e espaço. Aqui, no entanto, ela é usada de forma promíscua. Adotamos, nas últimas décadas, um modelo de redação da legislação que prioriza os conceitos abertos. Então, cada vez mais, precisamos que o tribunal diga qual é a lei. É uma distorção e o que novo Código fez foi tentar disciplinar”, disse ele, que considera o Código de Processo Civil de 2016 rico e promissor para a diminuição dos recursos repetitivos.

Participam também da aula magna o diretor da ESA/DF, Rodrigo Ferreira, e o coordenador, Marcos Cavalcante, além da vice-presidente da Comissão de Processo Civil, Lilian Albuquerque.