Juliana Boechat Fonte: Correio Braziliense – 23/03/2010 A luta contra a intervenção virou uma bandeira para a classe política do Distrito Federal. Representantes de partidos políticos e parlamentares correm contra o tempo para realizar as eleições indiretas que escolherão um governador tampão para ocupar a cadeira máxima do Executivo até 31 de dezembro. Deputados, senadores e presidentes de algumas legendas acreditam que a intervenção, mesmo que prevista na Constituição Federal, deve ser utilizada como último recurso. E que Brasília ainda tem condições de se sustentar sozinha até a posse do novo governador, que será eleito pelo povo no pleito de outubro e assumirá o Buriti em 1º de janeiro. Os políticos contrários à intervenção acreditam ainda que a escolha do líder provisório deve ser feita com cuidado para retomar a boa imagem das instituições públicas diante da população. Boa parte deles aderiu ao manifesto contrário à intervenção do governo federal no GDF, organizado pela seccional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) no Distrito Federal. A entidade mobilizou 54 assinaturas de associações, legendas políticas e personalidades públicas para formar um grande movimento contra a interferência na capital do país. Na próxima quinta-feira, às 16h, os integrantes do movimento darão um abraço simbólico no prédio do Supremo Tribunal Federal (STF) para defender a autonomia do DF. Entregarão o manifesto ao presidente do Tribunal, o ministro Gilmar Mendes. Ele é o relator da ação(1) protocolada no Supremo pelo procurador-geral da República, Roberto Gurgel, em 11 de fevereiro. Após analisar o pedido, Gilmar Mendes levará o assunto ao plenário, ainda sem data prevista. No documento, as entidades signatárias e o representantes repudiam as denúncias de corrupção no governo e no Legislativo e exigem a apuração dos fatos. “A Câmara funciona normalmente e ainda não requer a intervenção federal. Devemos tentar resolver o problema entre nós”, defende Cristovam Buarque, senador pelo PDT e ex-governador do Distrito Federal. “Defendo que uma alternativa é a eleição indireta”, reforça. O presidente do PR — partido do governador interino, Wilson Lima —, Izalci Lucas Ferreira, acredita que a intervenção não é a melhor forma de sair desta crise. “A intervenção pode vir de várias formas. Pode ter o viés político e o governo do DF ter ligação direta com o Palácio do Planalto, e ainda o viés de fiscais, que pode paralisar todas as instituições públicas de hoje”, explicou. Para ele, a estrutura pública está funcionando bem em meio à crise e, por isso, é capaz de escolher o governador tampão para cumprir os próximos oito meses de mandato. “É preciso preservar as condições e sanar os problemas. A sociedade não pode pagar o preço das pessoas que cometeram estas ilegalidades. Em outubro, é o momento de todos fazerem as mudanças”, defendeu. O deputado distrital Chico Leite (PT) concorda. “Se não melhorarem as pessoas que estão no governo, nada disso valerá a pena. As instituições de hoje estão contaminadas”, disse. Para ele, a melhor forma de resolver esta situação é com eleições diretas, como prevê a Constituição Federal. E comparou o momento de instabilidade política do DF a uma doença. “Antes da cirurgia, que é a medida mais drástica, os especialistas tentam tratamentos menos dolosos ao paciente. Se nenhum adiantar, e for realmente necessário, aí eles fazem a cirurgia”, explicou. Ele acredita que a interferência federal é penosa demais à cidade e, por isso, outras formas de retomar a normalidade devem ser encontradas. O presidente do PDT no DF, Ezequiel Nascimento, vai além: “A intervenção não resolve nada. Só cria mais problemas”, protestou. Ezequiel acredita que, de todos os males, o da intervenção é o pior. “Para o brasileiro, a esperança não morre nunca. E, por isso, o novo escolhido não pode ser de dentro da Câmara Legislativa. Não por achar que todos são culpados, mas porque a população está descrente dos parlamentares neste momento”, defendeu. Considerado o deputado distrital mais leal ao governador cassado José Roberto Arruda (sem partido), Raimundo Ribeiro (PSDB) também defende a autonomia do DF na escolha do governador temporário. O deputado acredita que a intervenção pode contrariar algumas normas previstas na Constituição Federal. “A Constituição prevê a linha sucessória. A intervenção só deve acontecer a partir do momento que todos os recursos forem exauridos”, defendeu. Presidente da comissão especial que analisou o pedido de impeachment de Arruda, o deputado distrital Cristiano Araújo (PTB) classifica a intervenção federal como retrocesso político. “Realizar a intervenção é um tiro na população do DF”, afirma. Ele sugere ainda cuidado na hora da escolha de um governador tampão por meio de eleições indiretas na Câmara Legislativa: “Tem que ser alguém que não tenha interesse político. Este processo não se restringe a colocar uma pessoa no governo, a população tem que concordar”. 1 – STF Em 11 de fevereiro, o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, ingressou no STF com um pedido de intervenção federal no DF. A solicitação deve ser julgada pelo Supremo até o fim de abril. Relator do caso, o ministro Gilmar Mendes pode ainda realizar audiências públicas para discutir o assunto antes de elaborar seu relatório. “A intervenção não resolve nada. Só cria mais problemas”. Ezequiel Nascimento, presidente do PDT no DF Depoimentos // Por que sou contra a intervenção “A Câmara funciona normalmente e ainda não requer a intervenção federal. Devemos tentar resolver o problema entre nós. A intervenção federal no DF será a prova do nosso fracasso. Por isso precisamos encontrar uma saída. Eu, pelo menos, não quero fazer parte de um time de políticos que fracassou com o Distrito Federal. Por isso defendo que uma alternativa é a eleição indireta. Mas, para fazer efeito, a Câmara Legislativa precisa escolher um governador tampão com cara de interventor. Ou seja, ele deve apresentar certas características. Deve, por exemplo, apurar com rigor tudo que houver de errado no governo, doa em quem doer; revisar os contratos de licitação e os contratos suspeitos do Plano Diretor de Ordenamento Territorial (Pdot). Não será fácil. E por isso defendo que seja alguém de fora da Câmara. Alguém de dentro pode ser suspeito. Esse então governador também não deveria ter partido político. Eles estão escolhendo alguém para governar a cidade nos próximos meses. Tem que haver um sinal de esperança para a população do DF”. Cristovam Buarque, senador pelo PDT e ex-governador do Distrito Federal “Nosso partido já defendeu a intervenção. Mas, quando o fizemos, no início da crise, o cenário era diferente. Achávamos que a medida era necessária graças à gravíssima situação do Distrito Federal. As instituições estavam faltando com a responsabilidade que lhes foi dada. Tanto é que um terço da Câmara estava envolvida nos escândalos de desvio de dinheiro. Ainda estamos longe do cenário ideal. Mas, de lá para cá, tivemos avanços. Acreditamos que, neste caso, a intervenção é um remédio amargo para a cidade. Não queremos essa medida. Uma saída política para evitar a intervenção é a eleição indireta na Câmara. Mas o governador escolhido pelos deputados deve se comprometer a não concorrer às eleições de outubro e a continuar as apurações contra as irregularidades. Brasília tem 50 anos e maturidade suficiente para eleger alguém que tenha este compromisso com a cidade. A crise ainda está aí. O governador não pode colocar panos quentes”. Marcos Dantas, secretário-geral do PSB no Distrito Federal O que diz a Constituição Federal Artigo 34: a União não intervirá nos Estados nem no Distrito Federal, exceto para: # Manter a integridade nacional # Repelir invasão estrangeira ou de uma unidade da Federação em outra # Acabar com grave comprometimento da ordem pública # Garantir o livre exercício de qualquer dos Poderes nas unidades da Federação # Reorganizar as finanças da unidade da Federação que suspender o pagamento de dívida por mais de dois anos consecutivos ou que deixar de entregar aos municípios receitas tributárias fixadas na Constituição # Prover a execução de lei federal, ordem ou decisão judicial. # Assegurar a observância dos princípios constitucionais.