Na última reunião deste semestre do Conselho Seccional da OAB/DF, que será realizada nesta quinta-feira (17/06), os conselheiros poderão debater com o deputado Luiz Pihauylino, presidente da Frente Parlamentar dos Advogados, temas como a reforma do Poder Judiciário e projetos em tramitação no Congresso Nacional de interesse da classe. O deputado foi especialmente convidado para a sessão para falar das atividades da Frente, que reúne parlamentares advogados de todos os Estados.
Ontem (16/06), Estefânia proferiu palestra no Auditório Nereu Ramos, da Câmara dos Deputados, sobre o tema “a efetividade da prestação jurisdicional”, em evento promovido pela Frente Parlamentar, com apoio da OAB e outras entidades. Na palestra, Estefânia defendeu o papel do advogado para efetivação da Justiça e o reaparelhamento do Poder Judiciário, principalmente sua modernização na área de informática.
Segue o pronunciamento da presidente Estefânia Viveiros:
“Senhoras e Senhores,
Antes de mais nada quero registrar a minha satisfação em estar participando deste ciclo de palestras e falar de um tema muito caro a todos os advogados brasileiros, que é a efetividade da prestação jurisdicional.
Quero aproveitar a oportunidade do tema para trazer à reflexão questões relacionadas à reforma do Poder Judiciário, que tramita nesta Casa e que é uma das questões centrais da crise que salta aos olhos de qualquer pessoa, mesmo o mais leigo, quando se trata da prestação jurisdicional. Em outras palavras, da efetividade da Justiça.
Trata-se, na verdade, de uma crise de justiça no sentido amplo, de um país em que há mais excluídos que incluídos socialmente. E, no sentido institucional, de um país cujo Poder Judiciário ainda não é acessível à maioria da população.
Sabemos que em um mundo em constante processo de mudança, o Poder Judiciário sofre, como todas as instituições do Estado contemporâneo, os reflexos e impactos das transformações. Mais do que qualquer outro Poder, permitiu-se – por razões que demandariam não apenas uma conferência, mas estudos bem mais profundos – que a estrutura do Judiciário se tornasse anacrônica, disfuncional, inadequada às demandas da sociedade moderna.
Por essa razão, pode-se afirmar que sua estrutura orgânica está ultrapassada. Apesar de todas as transformações por que passa o mundo nos campos da tecnologia, das técnicas de gerenciamento e administração e dos padrões de comportamento, nenhuma evolução efetiva foi introduzida nos diversos estágios de formação da decisão judicial.
Essas afirmações não constituem nenhum tipo de crítica ou denúncia contra o Judiciário brasileira. É uma opinião compartilhada por todos os que lutam por uma justiça ao alcance de todos, por uma efetiva prestação jurisdicional. É uma realidade da qual nós, operadores do Direito, não podemos fugir.
O pior é que o Judiciário, por razões diversas, ao longo dos anos, permaneceu alheio às transformações, como se estivesse indiferente à ação do tempo. Mas para que não se culpe apenas o Judiciário por essa estagnação, é preciso dizer que ele não foi o único dos Poderes da República nessa condição. Somente nos últimos anos é que o Estado brasileiro parece ter acordado dessa letargia e passou a discutir ajustes estruturais indispensáveis a seu funcionamento.
Aqui, cabe um registro histórico: A Ordem dos Advogados do Brasil, não é de hoje, vem alertando para a necessidade de reestruturar o Judiciário e promover justiça em todos os níveis.
O Judiciário precisa estar mais próximo da sociedade, mais ciente de suas necessidades e demandas, para não apenas melhor definir seu papel, mas, sobretudo, para melhor representá-lo. 10. O anacronismo estrutural do Poder Judiciário brasileiro torna-o ineficaz, acessível apenas aos mais afortunados. Na grande maioria do território nacional, a Justiça convive com a escassez e a precariedade. Em numerosas comarcas não há sequer papel. Em plena era da civilização digital, não há computadores e as velhas máquinas datilográficas mecânicas do início do século, a maioria quebrada, são a tecnologia dominante.
Sem estrutura, ou seja, sem magistrados suficientes e bem-formados, pessoal, equipamentos e recursos mínimos para provê-los, a Justiça não tem como chegar ao povo. 12. Se queremos levar justiça ao povo, tornar o Brasil um país mais civilizado, não há outra saída. Precisamos dotar o Poder Judiciário dos meios materiais básicos para que funcione. Parece simples, mas não é.
Vejamos alguns números. O Brasil dispõe atualmente de pouco mais de 10 mil juízes, para distribuir justiça a uma população de mais de 175 milhões de pessoas. Para que se tenha uma base de comparação, basta lembrar que a Alemanha, com 80 milhões de habitantes, menos da metade do nosso, dispõe de 120 mil juizes. Ou seja, doze vezes mais que nós.
Outro exemplo: na Itália, o Tribunal de Apelação, que corresponde ao nosso Superior Tribunal de Justiça, possui 400 juízes. O nosso STJ possui apenas 33. Com tal estrutura, não é de admirar que o Judiciário funcione precariamente e sua cúpula pretenda que a litigiosidade do povo brasileiro se ajuste ao estado de insuficiência no qual sobrevive.
Como se vê, há um longo caminho a percorrer. Da ausência de justiça advêm as pragas que assolam o nosso cotidiano: a pior delas, no meu entender, a impunidade. E daí também outra crise – a crise de credibilidade do Judiciário.
Nesse ponto, recordo aqui as palavras do ministro Sepúlveda Pertence, do Supremo Tribunal Federal, em recente palestra. Disse ele: “O Judiciário tem sua legitimidade condicionada à credibilidade da sociedade. E essa credibilidade não resiste à exacerbação da justa insatisfação popular com a ineficiência, o custo, a lentidão do funcionamento do serviço da Justiça.” E ressaltou: “A imensa maioria da magistratura brasileira é honrada e que a democracia verdadeira precisa de instituições judiciárias fortes, que possam impor a ordem jurídica a quem quer que seja.” 17. Mas, além dos problemas estruturais, o Judiciário padece ainda da sobrecarga provocada pela legislação processual, que não está contemplada na reforma do Judiciário. 18. Sempre que posso me manifestar publicamente, chamo a atenção para que a reforma se transforme em panacéia e remédio para todos os males da justiça. No meu entendimento, a reforma é apenas um primeiro passo – um passo que eu diria até tímido ainda – rumo ao Judiciário que todos queremos e os jurisdicionados precisam.
Por essa razão considero urgentes, indispensáveis, mudanças nos códigos processuais, onde é comum observarmos, numa mesma causa, inúmeros agravos de instrumento e recursos aos tribunais superiores.
Para que esses problemas sejam resolvidos, não se deve buscar bodes expiatórios. É preciso dividir responsabilidades. Se temos um Judiciário que não corresponde à expectativa da sociedade, é porque, devemos reconhecer, houve omissão dos demais poderes diante dos problemas que foram se acumulando. Mas sempre é tempo para se buscar soluções.
Gostaria, nesse ponto, de me referir ao papel especial do Advogado como profissional de perfil voltado para a defesa da sociedade, e, portanto, de uma melhor prestação jurisdicional.
Aos profissionais do Direito cabe papel fundamental na estratégia de mobilização social. Esse papel é decorrência não apenas da imprescindibilidade do advogado à administração da justiça, nos termos do artigo 133 da Constituição, mas em função do próprio fim humanístico inerente à Advocacia, responsável que foi pelas mais memoráveis páginas de grandeza da História do Brasil, a começar pelas campanhas da Independência, da Abolição da Escravatura, da produção de nossas Constituições, chegando, mais recentemente, às lutas pelo restabelecimento do Estado Democrático de Direito.
E em um verdadeiro Estado de Direito, todo acusado tem direito à defesa, independente da gravidade do delito ou da repercussão do fato. A decisão judicial, para ser justa, passa necessariamente pelo devido processo legal com amplitude de defesa. Não se pode nem se deve confundir a figura do acusado com a de seu defensor. O advogado não defende o pecado, mas aquele tido como pecador.
A Constituição garante aos cidadãos o direito à ampla defesa. Ao advogado compete a missão de assegurar o pleno exercício desse direito constitucional, ligado indissoluvelmente à cidadania.
A Ordem dos Advogados do Brasil há muito batalha para realizar uma eficaz e positiva integração entre os pólos do Poder Judiciário, na crença de que a conquista dessa meta redundará em benefícios para o exercício do Direito e a administração da Justiça. E, mais que isso, os contatos freqüentes entre os segmentos que compõem os pilares deste Poder contribuem de forma decisiva para aproximar a justiça da sociedade.
Enfim, ao advogado cabe a missão de defender a bandeira da ética e defender a moralidade dos atos humanos, lutar contra os abusos e as práticas ilícitas em todas as esferas da vida institucional. E ao defender a ética e a moralidade, o advogado estará se posicionando na vanguarda das lutas cívicas.
É inquestionável que sem Direito, não há Justiça; sem Justiça não há Democracia; sem Democracia, não há Liberdade. E uma Nação sem liberdade está condenada a se afastar dos horizontes da Ética e da Cidadania. Será uma Nação sem esperança, de olhos fechados ao futuro.
Muito obrigada!