Postura do Ministério Público em relação à OAB evoluiu

Por Rodrigo Badaró de Castro

No ano que ora se encerra, evoluímos muito quanto à postura do Ministério Público (MP) em relação aos advogados e à Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), o que é fruto da incipiente mudança de perfil ministerial, especialmente no que se refere a estabelecer uma isonomia de tratamento, que começou a ser reconhecida, bem como da necessidade de o membro do Parquet ser mais acessível à comunidade jurídica e à sociedade.

Nessa senda, o Conselho Nacional do Ministério Público, atendendo a clamores sociais e à própria OAB, percebeu a necessidade de fomentar o diálogo entre seus membros e a sociedade. De forma sábia, editou a Resolução 88, de 28 de agosto de 2012, que dispõe sobre a obrigatoriedade de membros do Ministério Público prestarem atendimento, sempre que lhes for solicitado, ao público e ao advogado de qualquer das partes. O respeito a esta prerrogativa dos advogados é um avanço na facilitação da comunicação entre as partes, o que imprime maior transparência e eficiência no trabalho do Ministério Público.

No entanto, é inegável que, com certa frequência, o MP quer fazer às vezes do magistrado e luta por prerrogativas que o distingam do advogado, como no caso da disposição da cátedra. Nessa linha, o MP, no dia 27 de novembro de 2012, obteve, perante o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), decisão que impediu a mudança da posição do representante do Ministério Público na cátedra, até o Supremo Tribunal Federal (STF) definir qual modelo deve ser adotado em todo o território brasileiro.

Essa questão é objeto da ADI 4.768, em trâmite no Supremo Tribunal Federal, ajuizada pelo Conselho Federal da OAB, que, após acolhimento unânime de parecer de minha relatoria no citado órgão, resolveu impugnar o artigo 18, alínea “a”, da LC 75/93, no que se refere a afastar a “prerrogativa” do MP de sentar-se ao lado do juiz, em nível diferente do advogado, nas causas que atua como parte e não como fiscal da lei.

Tal pretensão da advocacia já foi abraçada pelo Legislativo e vem sendo debatida no Congresso Nacional por meio do PLP 179/2012, que visa assegurar a isonomia e “paridade de armas”.

Não adentrando nas obrigações institucionais e legais, tem-se observado que o Ministério Público age, em certos momentos, com um excesso de ativismo, o que coloca em cheque o interesse público e o resguardo do regime democrático. Ao agir assim, o MP atua sozinho, isolando-se do papel que lhe é incumbido e afastando-se da sociedade, da Ordem dos Advogados do Brasil e da comunidade jurídica, que em tese buscam os mesmos objetivos.

O Ministério Público e a Ordem dos Advogados do Brasil são unidos na gênese pela formação técnica e na preservação do Estado Democrático de Direito. As questões que os distinguem são formais e de atribuições tão somente, pois, na essência, no dever, nas obrigações e na responsabilidade, são iguais, tanto quanto os juízes, sendo todos essenciais à administração da Justiça.

Vejo que o Poder Legislativo assim como o Poder Judiciário e até mesmo o Conselho Nacional do Ministério Público têm- se rendido à necessidade de união produtiva entre o MP e a OAB.

Volvendo-se para a OAB como entidade que deve andar pari passu com o Parquet, é de aproveitar este espaço para esclarecer alguns pontos suscitados pela afirmativa trazida no artigo da lavra do promotor de Justiça do estado de Minas Gerais Dr. André Luís Alves de Melo, com o título de “OAB não é entidade autárquica federal”, reproduzido pela revista Consultor Jurídico.

O nobre membro do parquet sustenta, com base no que definiu o STF ao julgar improcedente a ADI 3.026 (julgada em 2006), proposta pelo Procurador Geral da República, a qual visava a exigência de concurso público para provimento de cargos na OAB, que a OAB não é pessoa jurídica de direito público, nem mesmo autarquia, tampouco autarquia de regime especial, motivo pelo qual não poderia mais ser julgada pelo Judiciário Federal. Assim, afirma-se no referido artigo: “Logo, como a OAB não é mais autarquia especial, vincula-se pela ADIN que não tem mais foro federal”. Nessa linha, o ilustre articulista cita inúmeras decisões do STJ para corroborar sua tese.

Ora, é interessante registrar que as decisões mencionadas pelo referido Promotor (CC 47613 – DJU 22.08.2005 e REsp 235723 – DJU 04.11.2002) são anteriores ao definido pelo STF, razão pela qual não foram influenciadas pelo julgamento da ADI 3.026. Pelo contrário, inúmeras decisões recentes do STJ, posteriores a manifestação do STF, confirmam a competência da Justiça Federal para julgar ações em que a OAB seja parte.

Outras decisões, inclusive do ano corrente, reafirmam essa competência da Justiça Federal, havendo, em todas elas, exame específico sobre o reflexo da ADI 3.026, julgada pelo STF. Alguns desses julgados são: CC 121.574/DF (DJe 13.11.2012); CC 124.469/DF (DJe06.11.2012); CC 125.175/DF (Dje 24.10.2012).

Não se pode olvidar que as atribuições afetas à OAB pelo artigo 44, I e II, da Lei 8.906/94[1] têm natureza federal, e, com base nisso, o próprio Superior Tribunal de Justiça entende que “Não há como conceber que a defesa do Estado Democrático de Direito, dos Direitos Fundamentais, a regulação da atividade profissional dos advogados, dentre outras, constituam atribuições delegadas pelos Estados Membros.”[2]

Como se vê, ao contrário do que é sustentado pelo articulista, as causas nas quais a OAB figure como parte são de competência da Justiça Federal. Fica claro que a decisão do STF na ADI 3.026 não afetou a compreensão do STJ, tendo o mesmo a enfrentado de forma clara.

Por fim, vale relembrar que a OAB e o MP não são entidades diferentes porque defendem, muitas vezes, posições contrárias. São iguais e assim devem ser para o bem da justiça.

[1] Art. 44. A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), serviço público, dotada de personalidade jurídica e forma federativa, tem por finalidade:

I – defender a Constituição, a ordem jurídica do Estado democrático de direito, os direitos humanos, a justiça social, e pugnar pela boa aplicação das leis, pela rápida administração da justiça e pelo aperfeiçoamento da cultura e das instituições jurídicas;

II – promover, com exclusividade, a representação, a defesa, a seleção e a disciplina dos advogados em toda a República Federativa do Brasil.

§ 1º A OAB não mantém com órgãos da Administração Pública qualquer vínculo funcional ou hierárquico.

§ 2º O uso da sigla OAB é privativo da Ordem dos Advogados do Brasil.

[2] AgRg no REsp 1255052 / AP – DJe 14/11/2012

Fonte: Conjur

Receber advogado é um direito do cidadão

Por Marcus Vinicius Furtado Coelho

sexta-feira, 28 de setembro de 2012 às 10h18

Publicada em 25 de setembro último, a Resolução 88 do Conselho Nacional do Ministério Público, obriga promotores de justiça e procuradores da república receberem advogado, independente de prévio agendamento. Tal norma constitui em um instrumental para a adoção de medida contra o membro do Ministério Público que a descumprir. Para além, trata-se de relevante exemplo a ser seguido por toda e qualquer autoridade pública.

O advogado, quando busca ser recebido em audiência, fala em nome do cidadão, que é a razão de ser do Estado. Ouvir o advogado significa respeitar a cidadania, valorizar o estado de direito e assegurar o devido processo legal.

A lei federal 8.906, o estatuto da advocacia, assegura, por seu art. 7º, VIII, a prerrogativa do advogado se dirigir ao magistrado em seus gabinetes, independentemente de prévio agendamento. Faltava uma norma que explicitasse tal garantia em relação aos membros do ministério publico. A Resolução do CNMP supre tal lacuna. Por seus dispositivos, o advogado deverá ser recebido “independentemente de horário previamente marcado ou outra condição”. Havendo justificativa para o não recebimento no momento da solicitação, “o membro do Ministério Público agendará dia e horário para o atendimento, com a necessária brevidade”.

Importante normatização consiste na disciplina dos casos urgentes, “com evidente risco de perecimento de direito”. Nestas hipóteses, “garante-se o atendimento, inclusive em regime de plantão, quando for o caso”.

A Resolução do CNMP que garante a prerrogativa do advogado ser recebido em audiência independente de prévio agendamento, iniciativa do Conselheiro Fabiano, que a relatou, constitui uma importante vitória da cidadania e da advocacia, da qual foi protagonista a atual gestão do Conselho Federal da OAB.

Na mesma linha de defesa dos direitos e garantias do exercício profissional, o Conselho Federal da Ordem lançou o canal de prerrogativas, instrumento nas redes sociais para a profusão da matéria, demonstrando que o cidadão é o principal beneficiário do advogado valorizado.

A Resolução do CNMP é uma iniciativa que deve inspirar todos os órgãos e autoridades a editarem normatização semelhante, tornando expressa a garantia do advogado ser recebido em audiência, sem a necessidade da prévia agenda, diante do postulado constitucional assegurador da indispensabilidade do advogado à defesa dos direitos do cidadão.

Marcus Vinicius Furtado Coelho – secretário-geral do Conselho Federal da OAB

Respeitável público

“As figuras imaginárias têm mais relevo e verdade que as reais” Fernando Pessoa

No premiado documentário “Arquitetura da Destruição”, Peter Cohen defende que o nazismo só foi palatável para a população por ter sido apresentado como um projeto de embelezamento do mundo. Retratando Hitler como artista frustrado, Cohen argumenta que o intento destrutivo do nazismo se fundou em uma poderosa estética, impulsionada por uma eficiente propaganda.

Não se quer aqui taxar ninguém de nazista ou comparar alguém a Hitler. Busca-se mostrar, pelo exemplo extremo, o poder destrutivo da estética.

Ultimamente, tem se visto que algumas acusações, na boca de delatores ou formalizadas em denúncia, procuram sofisticar a sua narrativa e emprestar-lhe uma organização e beleza fora do comum. As acusações são recheadas de adjetivos. O fato tido como criminoso é guarnecido de uma série de estruturas, núcleos e funções, em um desenho perfeito.

Para esse acusador, o regozijo é maior quando não há provas, pois assim ele terá grande espaço para o seu design. Terá liberdade para conceber e desenhar o que considera a parte oculta do iceberg. Nessa parte oculta, dá vazão a todo o seu projeto de embelezamento ou frustração por não ser um artista de sucesso.

O “mensalão” é o maior exemplo dessa nova modalidade de design. A acusação não se limitou ao que há de efetivamente tangível no caso: operações financeiras entre partidos políticos e instituições financeiras. O toque estético foi dado por um pretenso delator, que, não por coincidência, é um cantor frustrado.

Do que havia de concreto, erigiu-se um enredo belo e palatável para o público, embora falso, criado: o pagamento sistemático, organizado e mensal para parlamentares. O melhor propagandista e marqueteiro não escolheria nome melhor e mais ao gosto da população: “mensalão”.

Já do acusador público esperava-se sobriedade. Afinal, ele estava lidando com um fato envolto em uma disputa política, destinada a desmoralizar um partido, como reconheceu recentemente o próprio delator.

O que se viu foi justamente o contrário. O acusador público tomou gosto pela arte do escândalo e sofisticou a estética da acusação, qualificando-a como “sofisticada organização criminosa”, “profissionalmente estruturada” em “núcleos”. Expressões como “engrenagem criminosa”, “organograma delituoso”, “engenharia criminosa” conferiram ar monumental à acusação.

O “grand finale” veio com as alegações finais, um memorial e uma sustentação oral proferidas já por outro acusador público. O ponto em comum dessas manifestações foi o gosto pela adjetivação. O edifício artístico passou a ter uma pomposa qualificação: o “mais atrevido e escandaloso caso de corrupção do Brasil”.

Poucos não reconheceriam que estética e marketing foram fundamentais para o sucesso do projeto político destrutivo do pretenso delator. O que poucos têm ressaltado é que também os acusadores públicos buscaram empregar uma bela arquitetura e um cativante enredo para o sucesso de público de sua tese.

O STF fará um julgamento técnico, não estético. Pensando no público, o acusador deve ter linguagem sóbria, clara, comedida e prosaica. Os fatos da vida merecem ser retratados com a mais sofisticada estética. Todavia, quando se pede a condenação de pessoas, não deve haver espaço para a estética, sob pena de se tornar o processo um jogo cruel.

Caro leitor, caso você se depare com uma acusação muito organizada, bela e sofisticada, suspeite! Você pode estar lidando com um artista frustrado ou um acusador arquitetando a destruição de alguém.

ANTÔNIO CARLOS DE ALMEIDA CASTRO, 54, e PEDRO IVO VELLOSO CORDEIRO, 28, são advogados criminais e defendem Duda Mendonça e Zilmar Fernandes na ação penal 470.

Fonte: Folha de S. Paulo

Honorários sucumbenciais não são receita pública

Não obstante a Advocacia Pública seja tratada na disciplina constitucional como função essencial à Justiça, ao lado do Ministério Público, da Defensoria Pública e da Advocacia stricto senso, o desígnio de tratamento isonômico entre essas carreiras está longe de ser implementado.

Os advogados públicos possuem entre suas funções a defesa do regime democrático, a viabilização das políticas públicas, o controle de legalidade e constitucionalidade dos atos administrativos, entre outras atribuições indispensáveis para toda a sociedade. Todavia, fato é que o Governo Federal e outros entes federados estão descumprindo com o que determina a Constituição e as leis.

A titularidade dos honorários advocatícios de sucumbência, aqueles fixados pelo juízo no processo contencioso em que a Fazenda Pública seja vencedora, aos Advogados Públicos é um dos vilipêndios à legalidade.

Alguns governos declaram, unilateralmente, ao alvedrio da lei, que enxergam os honorários advocatícios como “receita pública”. Embora o façam sem qualquer respaldo legal, face o que determina a Lei n.° 8906/94, assim tem ocorrido diante da inércia que dificulta a mudança de certos paradigmas, ainda que bastante frágeis em suas bases.
A Lei n.º 8.906/94, também conhecida como o Estatuto dos Advogados ou da Ordem dos Advogados do Brasil, deixa claro que os honorários pertencem ao advogado, sem fazer qualquer ressalva, seja ele público ou privado, assim dispondo:

Art. 3º […]
§ 1º Exercem atividade de advocacia, sujeitando-se ao regime desta lei, além do regime próprio a que se subordinem, os integrantes da Advocacia-Geral da União, da Procuradoria da Fazenda Nacional, da Defensoria Pública e das Procuradorias e Consultorias Jurídicas dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e das respectivas entidades de administração indireta e fundacional.

Art. 22. A prestação de serviço profissional assegura aos inscritos na OAB o direito aos honorários convencionados, aos fixados por arbitramento judicial e aos de sucumbência.

Art. 23. Os honorários incluídos na condenação, por arbitramento ou sucumbência, pertencem ao advogado, tendo este direito autônomo para executar a sentença nesta parte, podendo requerer que o precatório, quando necessário, seja expedido em seu favor.

Art. 24 […]
§ 3º É nula qualquer disposição, cláusula, regulamento ou convenção individual ou coletiva que retire do advogado o direito ao recebimento dos honorários de sucumbência.

Uma interpretação literal, sistemática e teleológica dos dispositivos transcritos afasta qualquer celeuma interpretativa, ficando evidente que o legislador fixou, de forma intencional, específica e redundante, a titularidade dos honorários ao advogado. Não obstante tal entendimento, fato é que algumas questões merecem um olhar mais detido.

Primeiramente, registre-se que esses honorários, os sucumbenciais, não integram a remuneração do Advogado Público, ou seja, não integram a remuneração paga pela Fazenda Pública ao seu “servidor”. Isso porque os honorários sucumbenciais não são pagos pelos cofres públicos, e sim pela parte contrária, vencida na demanda.

Segundo, enquanto a remuneração dos advogados públicos tem caráter administrativo, os valores recebidos como honorários sucumbenciais tem características civis. Tratando-se de elemento do custo do processo[1], ao lado das demais despesas processuais com que a parte deve arcar.

Acrescente-se que é a natureza do representante judicial (o fato de ser advogado) e não a natureza da parte (ser entidade pública ou privada) que importa para aferição do direito aos honorários. Assim, os Advogados Públicos, como são Advogados, regularmente inscritos na OAB, submetidos ao Estatuto, tem a titularidade dos honorários.

De outro giro, as diretrizes do CPC dão relevo ao aspecto da prestação do serviço. É nesse contexto de valoração do “zelo profissional”, do “trabalho realizado pelo advogado” e, mormente, diante da absoluta falta de lei autorizadora, que causa estranheza a apropriação desses honorários sucumbenciais como “receita pública”.

A tentativa de subordinar a sua percepção, pelos advogados públicos, às normas orçamentárias estatais e às exigências relativas à fixação de vantagens remuneratórias para os servidores públicos configura-se como evidente apropriação indébita. Reforça-se que os honorários sucumbenciais não decorrem do regime de contratação ou da política de remuneração estatal, tratando-se de retribuição profissional específica dos advogados, de caráter civil, fixada caso a caso pelo Poder Judiciário e devida pela parte vencida.

Se o fundamento dos honorários sucumbenciais é a lei civil, e não lei de caráter administrativo, e sendo os advogados públicos, identicamente advogados, submetidos à mesma “lei civil” que os advogados “privados” nesse e em outros pontos, devem receber os honorários.

Com base nessas premissas constata-se que o não recebimento fere o direito à propriedade, uma vez que o estatuto prevê que os honorários pertencem ao advogado, como direito autônomo. E nesse ponto repise-se: sendo a Fazenda Pública vencedora da lide, a verba sucumbencial é solvida pelo perdedor da lide, o que fulmina a argumentação de que esse valor seria integrado aos cofres públicos, uma vez que não advêm de qualquer ato praticado pela administração.

Como se observa, os honorários são direito autônomo dos advogados públicos e a transformação deles em verba pública configura verdadeira expropriação de recursos cuja titularidade é do advogado. Assim não fosse, não deveria a parte perdedora da lide sequer pagar os honorários, eis que não há previsão legal de pagamento de honorários para outra pessoa ou entidade que não o profissional advogado.

Soma-se a isso o fato de que o pagamento dos honorários aos Advogados Públicos pode funcionar como mais um estímulo ao melhor desempenho possível, uma vez que somente serão pagos nas ações em que a Fazenda Pública sair vitoriosa. Nesse sentido, no contexto de uma administração gerencial voltada a resultados, nunca se poderia entender o pagamento dos honorários aos Advogados Públicos como hipótese de se estar abrindo mão de recursos públicos (em verdade os recursos são dos advogados, como já constatado), mas sim deveria ser visto como um investimento em melhores resultados.

A identificação de que devem ser advogados esses profissionais que atuam na defesa jurídica do Estado não deve servir apenas para a existência de pré-requisito específico nos concursos públicos, mas também para lhes garantir os direitos que exsurgem dessa mesma condição. Os honorários advocatícios são o fruto do trabalho de um profissional e sendo fruto de um trabalho profissional devem ser pagos ao próprio profissional.

Uma Advocacia Pública forte significa que a sociedade terá uma melhor defesa do seu patrimônio. Portanto, investir nos advogados públicos é investir no interesse público, no melhor controle da legalidade e de constitucionalidade dos atos administrativos, na melhor solução dos litígios, na defesa dos valores republicanos e do regime democrático.

Inclusive, a continuar essa lógica, as partes vencidas que litigam contra a Fazenda Pública, a qual não destina esses valores aos seus Advogados Públicos, também estariam sendo lesadas, uma vez que não justifica o pagamento de honorários ao respectivo ente federado, mas sim ao advogado público.
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[1] LOPES, Bruno Vasconcelos Carrilho. Honorários Advocatícios no Direito Processual Civil Brasileiro. 2006. Dissertação de Mestrado. Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, p.10.

Allan Titonelli Nunes é procurador da Fazenda Nacional, presidente do Forúm Nacional da Advocacia Pública Federal e do Sindicato Nacional dos Procuradores da Fazenda Nacional (Sinprofaz)

Fonte: Conjur

O respeito à privacidade e a Lei de Acesso à Informação

Nas Minas Gerais e em outros rincões demasiadamente explorados na época do Brasil colônia sempre reinaram lendas e simbolismos, dando origem a hábitos e expressões afeitas àquela antiga necessidade de se proteger contra os abusos dos portugueses.

Não é raro notar as mesas de refeições antigas, feitas com madeira de lei, hoje impensáveis do ponto de vista ambiental, ordenadas como esculturas e detalhes que impressionam. Um dos detalhes que sempre me chamou atenção são as gavetas, onde evocando os mitos, eram usadas para esconder o prato de comida em caso de repentina chegada de alguém, evitando dessa forma, divisão daquela preciosa refeição.

Com efeito, a lenda colonial, juntamente com a preocupação em demonstrar suas posses e bens, decorre da defesa da excessiva exploração sofrida, tanto pelos povos das Gerais como de muitos outros estados do Nordeste. A desconfiança, simplicidade e até o ímpeto de enfrentamento de muitos nascidos nessas bandas, são reações naturais a exploração e abuso sofridos.

Talvez por isso, somado por obvio à segurança, e ainda à eterna luta pela privacidade, não é raro se ver o natural recato familiar quanto à demonstração de valores de sua remuneração. É até clichê de postura e educação nunca indagar quanto outra pessoa recebe pelo seu oficio. Imagine sua sogra ou sogro fazendo referido questionamento no primeiro encontro. O famoso “escondendo o ouro”, expressão tão usada e certamente fruto da época citada, agora não tem mais vez diante da Lei 12.537/2011, conhecida como a Lei de Acesso à Informação.

A referida lei, que acompanha tendência internacional, aqui lembrando a Resolução 59 da ONU, e a presença de arcabouço legal semelhante em inúmeros países, inclusive da América Latina, como Argentina, México, Chile e Uruguai, e sob a égide do principio da máxima divulgação, obrigação de publicar e promoção de um governo aberto, vem gerando muito debate e também polêmica, principalmente no que se refere à divulgação ampla das remunerações de todos os servidores.

Tanto é que em recente decisão proferida pela 22ª Vara da Justiça Federal de Brasília, mantida pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região, restou consignado pelo julgador que não há na lei nenhum comando no sentido de que fossem divulgados à sociedade, à guisa de transparência, dados referentes aos recebimentos dos agentes públicos.

Por outro lado, o ilustre presidente do Supremo Tribunal Federal suspendeu a citada decisão, tendo como um de seus inúmeros argumentos, veiculados na imprensa, que “não cabe, no caso, falar de intimidade ou de vida privada, pois os dados, objeto da divulgação em causa, dizem respeito a agentes públicos enquanto agentes públicos mesmos”.

A transparência e legalidade devem ser sempre exultadas, e assim parece ser a vontade popular, e aqui sem querer enfrentar as críticas de alguns quanto à influência popular e da mídia em decisões judiciais, registro trecho de Castro Alves, quando diz que o povo “é como o Sol, que da treva escura rompe um dia co’a destra iluminada, como Lázaro estala a sepultura”.

Assim, não há mais volta e a lei certamente atende aos anseios de todos. Contudo o debate será intenso e indaga-se se realmente a lei respalda lançar na internet todos os recebimentos. Será razoável termos os acessos aos sítios dos órgãos públicos congestionados com curiosos querendo saber a remuneração dos outros? E o pior, já que queremos transparência, não lançar dados completos, quando a remuneração tem como base indenizações, débitos antigos, prêmios, etc. faz crer que aquele valor informado é o recebimento mensal e continuo do cidadão.

Não há duvidas que os agentes públicos e a coisa pública devem ser tratados como tal, nem que todos devem ter acesso às informações que porventura tenham interesse de conhecer. Todavia, o grande receio e talvez pergunta é se efetivamente, sob o manto da abertura total de informações, é razoável simplesmente lançar ativamente, sem provocação, os dados do servidor.

O ilustre Dr. José Afonso da Silva definiu bem a liberdade de informar, deixando ao final com sabedoria a preocupação quanto a possíveis abusos, ao afirmar que ela “compreende a procura, o acesso, o recebimento e a difusão de informações ou idéias, por qualquer meio, e sem dependência de censura, respondendo cada qual pelos abusos que cometer”.

A privacidade, mesmo com previsão Constitucional, nos termos do artigo 5º, inciso X, não é absoluta, lembrando também que o acesso a informações está abarcado no artigo 5º, inciso XXXIII e artigo 37, parágrafo 3º, e aqui somado às decisões judiciais que começam a apreciar e suspender publicações de salários nota-se que ainda teremos muita discussão.

São muitos os avanços do Estado e da sociedade, tendo como alavanca a transparência, mesmo que abrindo mão de privacidades. Contudo, o cuidado deve ser a regra e não a exceção. Nos dias que correm, mesmo vivendo um de tempo de insegurança, com exposição exagerada de tudo e todos, por redes sociais, internet, cruzamentos de dados entre órgãos fiscalizadores, não há mais como “esconder o ouro”.

Por fim, respeitemos as leis e suas consequências, alerta para que a busca incessante por informações não se transforme da cura a enfermidade, capaz de soterrar de vez a toda e qualquer privacidade.

Rodrigo Badaró de Castro é advogado.

Fonte: ConJur

Em defesa do direito de defesa

Fora canibais da honra, gente bem-intencionada me indaga por Cachoeira. Na advocacia, o desafio fascina: pelos direitos do acusado, enfrentar o Estado.

Em 1956, solicitador acadêmico -o equivalente de então de estagiário-, comecei a advogar.

Exerci a atividade ininterruptamente, de forma intensa, conquanto modesta, até 2002. Parei em 2002 e assumi, extremamente honrado, o Ministério da Justiça, no governo Lula, onde fiquei por 50 meses.

Fiz uma quarentena, que não me era obrigatória, até final de 2007, quando voltei a me dedicar ao meu verdadeiro ofício, a prática legal. Ou seja, para terminar esta exposição cheia de datas, de 1956 a 2012 (56 anos) fui ministro por quatro anos. Os outros 52, devotei-os à advocacia.

Também servi à profissão como dirigente da OAB-SP e da OAB nacional. Na vida profissional, alguns momentos me orgulharam muito: as Diretas Já, a Constituinte, o julgamento dos assassinos de Chico Mendes, a fundação do Instituto de Defesa do Direito de Defesa e muitas centenas de defesas que assumi, tanto no júri como no juiz singular.

No Ministério da Justiça, a reestruturação da Polícia Federal, a construção do Sistema Penitenciário Federal, a reforma do Judiciário, a campanha do desarmamento, a reformulação da Secretaria de Direito Econômico, a implantação do Sistema Único de Segurança Pública, o pioneiro Programa de Transparência, a demarcação da terra indígena Raposa Serra do Sol e a fundação da Força Nacional de Segurança Pública.

Foram duas fases bem distintas e demarcadas. Numa, o serviço público, trabalho balizado sob o signo de duas lealdades que nunca colidiram: às instituições e à Presidência.

Noutra (advocacia e OAB), primeiro a luta pelo estabelecimento de um Estado de Direito; depois, a prática profissional, que procurei marcar pelo respeito à ética, ao estatuto da OAB, às leis e, principalmente, à Constituição brasileira, entre cujos dogmas fundamentais estão assegurados o direito de ampla defesa, o devido processo legal, o contraditório, a licitude das provas, a presunção de inocência e, de forma geral, a proibição dos abusos.

Durante essa longa trajetória de advogado que vota no PT -não de petista que advoga-, tive muitas oportunidades de representar clientes vistos como inimigos figadais do partido. (Não cito nomes, para preservá-los.) Nenhum foi recusado por isso.

Desse modo, salvei minha independência como defensor, nunca a alienando a quem quer que fosse. A liberdade do advogado é condição necessária da defesa da liberdade.

Assim como representei centenas de clientes dos quais nunca recebi honorários, trabalhei para muitos que puderam pagar, alguns ricos, entre pessoas físicas e empresas.

Agora que aceitei representar, no campo criminal, o senhor Carlos Augusto Ramos, apelidado de Cachoeira, surgem comentários sobre a minha atuação, estritamente técnica.

Fora os costumeiros canibais da honra alheia -aos quais não dou atenção nem resposta-, pessoas que parecem bem-intencionadas questionam se eu poderia (ou deveria) ter me incumbido dessa defesa, ou porque fui Ministro da Justiça, ou então porque sou ligado ao PT e ao ex-presidente Lula, ou, ainda, “porque não tenho necessidade de fazer isso”.

A todas essas dúvidas, a resposta é negativa. Nada me proíbe, nesta altura da vida -como nunca antes, à exceção do tempo do serviço público- de assumir a defesa de alguém com quem não me sinto impedido, legal, moral ou psicologicamente, cobrando ou não honorários.

Entre tantos casos importantes em que venho trabalhando, dois chamaram muito a atenção pública: esse e o das cotas na UnB. No primeiro, estou recebendo honorários; no segundo, trabalhei “pro honorem”, ou seja, sem nenhuma remuneração.

Em matéria criminal, aumenta a responsabilidade do advogado, nos termos do nosso código de ética: “É direito e dever do advogado assumir a defesa criminal, sem considerar a sua própria opinião sobre a culpa do acusado”. Porque, como diz Rui Barbosa, indo nas raízes da questão:

“Quando quer e como quer que se cometa um atentado, a ordem legal se manifesta necessariamente por duas exigências, a acusação e a defesa, das quais a segunda, por mais execrando que seja o delito, não é menos especial à satisfação da moralidade pública do que a primeira. A defesa não quer o panegírico da culpa ou do culpado. Sua função consiste em ser, ao lado do acusado, inocente ou criminoso, a voz dos seus direitos legais.”

O fascinante da profissão é o seu desafio. Enfrentar o Estado -tão provido de armas, meios e modos de atingir o acusado- e ser, ao lado deste, a voz de seus direitos legais.

Há 12 anos, escrevi neste mesmo espaço um texto com o mesmo título: “Em defesa do direito de defesa”. Não esperava ser convidado a escrever outro, sobre o mesmo tema, depois de tantos avanços institucionais que o Brasil viveu de lá pra cá.

*MÁRCIO THOMAZ BASTOS, 76, é advogado criminalista. Foi ministro da Justiça (de 2003 a 2007, governo Lula)

As desigualdades sociais e regionais, direitos humanos e intolerância

O artigo “As desigualdades sociais e regionais, os direitos humanos e a intolerância” é de autoria do secretário-geral da Ordem dos Advogados do Brasil, Marcus Vinicius Furtado Coêlho:

A República Federativa do Brasil é fundada na diminuição das desigualdades sociais e regionais, em vista a construção de uma sociedade justa, fraterna e solidária, afirmando o postulado da dignidade da pessoa humana.

São princípios complementares, pois não há falar em proteção aos direitos humanos sem assegurar oportunidades iguais a todos os nacionais.

A igualdade formal ou jurídica não é suficiente para atender as exigências do mundo atual, fazendo-se necessário construir a igualdade material, no plano dos fatos, na realidade concreta. Daí a essencialidade das ações afirmativas, concretizando a igualdade, ao tratar desigualmente os desiguais, na medida inversa em que se desigualam. O ordenamento, ao editar uma cercadura de proteção às minorias sociais e aos excluídos, como se verifica nos casos da lei Maria da Penha e das quotas raciais, dá efetividade ao postulado da dignidade da pessoa humana.

A emancipação dos excluídos e a superação das desigualdades regionais são tarefas fundamentais para a realização valor igualdade.

O massacre contra Judeus em Toulouse, França, e a prisão de dois homens, em Curitiba, por mensagens racistas contra nordestinos e negros, fatos ocorridos há poucos dias, devem merecer reflexão sobre o risco da ideologia extremista, pregadora da superioridade de uns sobre os outros, negadora da sociedade pluralista, fraterna e igual.

A proibição de qualquer forma de discriminação, inclusive de raça, sexo e origem, bem assim a diminuição das desigualdades sociais e regionais, promessas constitucionais inconclusas, devem ser efetivadas como antídoto ao discurso reacionário que provoca práticas desumanas.

Em igual modo, a construção de um Brasil igual torna necessário o tratamento afirmativo em relação aos Estados menos populosos e com menor desenvolvimento sócio-econômico, com a aplicação da teoria material da igualdade. É dizer, os Estados da federação menos aquinhoados devem ser tratados com a proteção política de sua importância no contexto da federação. Tal pacto federativo é essencial para a sobrevivência da Nação e para o cumprimento da promessa constitucional de diminuição das desigualdades regionais. Todas as medidas políticas que visam diminuir a importância dos Estados menos populosos ferem frontalmente tal princípio constitucional.

Reconhecer no outro uma pessoa merecedora de tratamento digno, eis o sinal de civilidade, significando a vitória da ideologia cristã da sociedade fraterna. Por certo, o cristianismo trouxe “uma inestimável contribuição à consciência política do ocidente e a partir dele, para todo o mundo: a dignidade inviolável da pessoa humana, por pobre e miserável que apareça; daí se derivam os direitos universais, os ideais de igualdade, liberdade e fraternidade, e a própria idéia de democracia.”(1).

Não se olvide que a Páscoa, entre os Hebreus, marcava a libertação dos escravos do Egito, sob a liderança de Moisés, em 1250 a.C, durante o reinado do Faraó Ramsés II. O projeto fraterno possui crença “na força dos pequenos e dos que sofrem, que é luz para o mundo; na causa dos menores abandonados, dos desempregados, dos povos indígenas, dos sem-terra e dos migrantes; na sua força histórica e no seu futuro; na possibilidade de transformações que farão emergir um mundo novo para todos.”(2)

O projeto de sociedade inspirada nos ideal de igualdade há de povoar coração e mentes de cristãos e não-cristãos, englobando todos que não se conformam com a realidade brasileira, permeada por um enorme fosso sócio-econômico que separa os poderosos e os de baixo, vendo na participação cidadã uma forma de superação da atual estrutura social e a efetividade dos direitos humanos. Tais direitos são reconhecidos historicamente, tendo gradual origem na defesa de novas liberdades contra velhos poderes, mas são fundamentais e inerentes à natureza humana (3). Os direitos humanos são reconhecidos, não concedidos, pela sociedade política (4).

O Estado Democrático de Direito apenas existe onde ocorre o devido respeito aos direitos humanos. Não há um sem o outro, pois a autonomia privada e a autonomia pública se pressupõem mutuamente. Não há como o cidadão fazer bom uso de sua autonomia pública sem liberdade de escolha. Por outro ângulo, a independência na esfera privada apenas existe com a utilização adequada da autonomia pública (5). Os direitos políticos, inerentes a democracia, e os direitos individuais de liberdade, são indissociáveis.

A intolerância e o autoritarismo andam juntos, são duas faces do mesmo problema social, incompatíveis com a democracia, que pressupõe a pluralidade, com a respeitosa convivência entre os diferentes. Não por acaso, as pessoas intolerantes tendem ao autoritarismo. Os regimes extremistas costumam ser ditatoriais. A ditadura é o regime dos intolerantes. O autoritarismo é a conduta dos “donos da verdade”, incompatíveis com o respeito aos direitos humanos.

Tornar efetivo o valor constitucional da igualdade, diminuindo as desigualdades sociais e regionais, bem assim efetivando o pleno respeito aos direitos humano, eis a meta a ser alcançada para impedir a escalada da intolerância e assegurar a vitória do regime da pluralidade, da fraternidade e da centralidade da pessoa humana.

Referências:
(1)BOFF, Leonardo. Cristianismo, O Mínimo do mínimo. Ed. Vozes, RJ:2011, pags. 176/177.
(2)

Grechi, Dom Moacyr. Pronunciamento por ocasião de seu Jubileu Sacerdotal. Missa Solene, Catedral Sagrado Coração de Jesus, Porto Velho, Rondônia, 29 de junho de 2011.
(3)

BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos. Rio de Janeiro: Editora Campus, 1992. Pág. 05.
(4) HERKENHOFF, João Baptista. Curso de Direitos Humanos – Volume I (Gênese dos Direitos Humanos). São Paulo: Editora Acadêmica, 1994. Pág. 30 e 31.

Fonte: Conselho Federal da OAB

Implantar sistema presidencialista na OAB é retrocesso

A OAB é uma instituição que, entre outros, tem por objetivo defender a ordem jurídica do Estado democrático de Direito. Talvez por esta relevante função, muitas vozes têm se levantado para questionar o sistema de eleição para a presidência nacional da OAB, no intuito de criar polêmica argüindo uma falsa idéia de que as eleições na OAB são indiretas.

Não é o que estabelece a lei.

A Lei Federal 8.906, de 4 de julho de 1994, estabelece, em seu artigo 64, que a eleição será feita por chapa. As chapas são todas votadas diretamente pelos advogados nos seus respectivos estados.

Os conselheiros seccionais e os conselheiros federais integram chapas que são votadas diretamente pelos advogados de todo o Brasil, e a diretoria executiva do Conselho Federal é eleita pelos conselheiros federais.

O artigo 45 do Estatuto da Advocacia dispõe sobre a estrutura da OAB e explicita que esta é composta de órgãos colegiados.

Por sua vez, os artigos 54 e 58 do Estatuto, quando tratam das competências relativas à instituição, atribuem todas elas, ora ao Conselho Federal, ora ao Conselho Seccional. E ao presidente compete dar execução às decisões do colegiado – Conselho Federal ou Seccional.

O Conselho Federal da OAB, eleito diretamente pelos advogados, é o órgão supremo da instituição, conforme estabelece o artigo 62 do Regulamento Geral. É, de fato e de direito, quem governa a Ordem. O Conselho atua mediante e por intermédio dos demais órgãos, de acordo com o artigo 64 do mesmo diploma legal.

Portanto, o sistema governativo da OAB é democrático e participativo com decisões tomadas pelo colegiado, sendo os assuntos discutidos publicamente com total transparência. Não há concentração de poder na figura do presidente. O poder é do Conselho.

É importante lembrar que a organização dos poderes prevista na Constituição Federal para a República prevê divisão entre Executivo, Legislativo e Judiciário, com atribuição de competência privativa para cada um dos poderes. Na OAB, é o contrário, só existe um poder: o Conselho Federal. O presidente, que preside o Conselho, sequer tem voto nas apreciações das matérias. Pode apenas votar em caso de empate.

Consoante se vê, o sistema de administração da OAB é o de assembleia, com atribuições de todos os objetivos e de todas as finalidades da OAB, ao Conselho.

Querer implantar um sistema presidencialista na Ordem, acredito ser um retrocesso, porque passa necessariamente pela atribuição de poderes a uma única pessoa, o presidente. Cria-se uma instância governativa, tirando poderes do Conselho, o que, sem dúvida, não se coaduna com o sistema de decisões coletivas que tem sido o alicerce de posicionamentos da Ordem.

É ainda oportuno salientar que os órgãos do Poder Legislativo no Brasil possuem presidentes que não são eleitos diretamente e nem por isso carecem de legitimidade. Exigir eleições diretas para presidente da OAB é o mesmo que exigir eleições diretas para presidente da Câmara, do Senado, das assembléias legislativas e das câmaras de vereadores.

A Ordem dos Advogados do Brasil, com o seu sistema de decisões colegiado, tem prestado relevantes serviços ao Brasil. Tem se posicionado pelas liberdades democráticas, pelo respeito aos direitos humanos e aos princípios fundantes da República. É defensora intransigente da advocacia e das prerrogativas dos advogados. Controla e disciplina o exercício da advocacia de forma transparente e elogiável. Nunca se omitiu na luta em defesa da sociedade. Mudar esse sistema que tem dado certo e que, por meio dele, a OAB tem prestado tantos e relevantes serviços ao país, é temerário.

Não podemos mudar um sistema democrático e transparente para apostarmos em outro que concentra poderes, num momento em que o mundo caminha em sentido inverso, ou seja, a repartição de poderes para evitar as tentações que o poder concentrado proporciona.

*Orestes Muniz Filho é conselheiro federal pela OAB/RO e mestre em Direito Constitucional pela UFMG.

Fonte: ConJur

Sobre críticas e falácias: o debate em torno do projeto do novo CPC

O projeto do novo Código de Processo Civil (CPC) em tramitação na Câmara dos Deputados tem oportunizado à sociedade brasileira mergulhar nos debates em torno da busca de caminhos capazes de atenuar a crise que se abate sobre o nosso Poder Judiciário, apontado diuturnamente como ineficiente e moroso. Como toda obra humana, o projeto contém defeitos e virtudes que vêm sendo apontados nas audiências públicas realizadas pelo Parlamento.

Diversas críticas são procedentes e advêm de estudiosos, práticos e leigos que se preocupam com o aperfeiçoamento da legislação e das instituições. Outras, porém, percorrem a trilha sinuosa das falácias e, para prevalecer, apostam na desinformação geral.

Legou-nos Arthur Schopenhauer importante estudo sobre a dialética erística, que é a arte de discutir de modo a vencer, seja por meios lícitos ou ilícitos. No livro “Como vencer um debate sem precisar ter razão”, o filósofo alemão discorre sobre trinta e oito estratagemas que podem orientar a dialética, qualificada por ele como uma esgrima intelectual com o objetivo de vencer uma controvérsia.

Dentre esses estratagemas, sobressai o chamado argumentum ad auditores, utilizado geralmente quando se discute um assunto altamente técnico perante um público não-iniciado. Em casos assim, ensina Schopenhauer, basta formular “uma objeção inválida, mas cuja invalidade só um conhecedor do assunto pode captar. E, ainda que o adversário seja um conhecedor do assunto, não o são os ouvintes”.

Recentemente, uma grande revista de circulação nacional veiculou entrevista na qual, ao lado de algumas poucas críticas legítimas e fundadas, o entrevistado optou por enveredar-se na senda tortuosa das falácias, expressando meias verdades, quando não inverdades inteiras, na crença de que atingiria público não iniciado em Direito, e menos ainda em direito processual civil.

Apenas com o intuito de trazer elementos para que as pessoas formem seu convencimento à luz de informações menos parciais, destacaremos dois mitos que se tem pretendido construir à base de argumentos falaciosos.

“O único problema da Justiça brasileira é a falta de orçamento suficiente para contratação de mais juízes e serventuários”.

Trata-se de meia-verdade, pois a superação da crise de nosso Poder Judiciário depende de ações simultâneas em três frentes distintas: i) ampliação do orçamento; ii) melhor gestão dos tribunais e varas judiciais; e iii) lei processual mais racional. Dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) indicam que isoladamente as duas primeiras são insuficientes para resolver o problema da morosidade.

O relatório “Justiça em Números” do CNJ nos mostra que em 2010 o orçamento da Justiça Estadual teve o expressivo aumento de 7% em comparação com 2009, saltando de R$ 22,3 bilhões para R$ 23,9 bilhões. Não obstante isso, a taxa de congestionamento na fase de conhecimento em 1º grau cresceu 4%, passando de 56% para 60%.

Sendo mais claro: enquanto o orçamento do Judiciário cresceu acima da inflação e do PIB nacional, a quantidade de processos encerrados em 2010 diminuiu em relação a 2009, alcançando a marca alarmante de 60% remanescentes em estoque de um ano para o outro.

Numa perspectiva econômica, é fácil perceber que não desejam qualquer mudança aqueles que insistem em defender como único caminho a mera ampliação do orçamento da Justiça brasileira a patamares praticados em países desenvolvidos.

Ao mirar algo inexeqüível no curto e no médio prazo, apostam que tudo permanecerá como está, pois ante as limitações orçamentárias experimentadas pelo Brasil, tal aumento pressuporia incremento substancial da carga tributária suportada pelo contribuinte, o que, evidentemente, inviabiliza sua operacionalização.

Isso sem falar que devido à baixa qualidade do ensino jurídico no Brasil e à elevada qualificação técnica exigida dos juízes, se tornou extremamente comum concursos para a magistratura terem pouquíssimos aprovados. Assim, onde recrutaríamos instantaneamente mil ou dois mil novos juízes, sem comprometer a qualidade da atividade jurisdicional?

“O projeto concede ‘super poderes’ aos juízes de primeiro grau por eliminar o agravo retido e o efeito suspensivo da apelação”
Trata-se de inverdade completa.

Primeiro, é incorreto falar que o projeto suprime o agravo retido, sem mencionar que juntamente com ele desaparecerão as situações em que hoje é cabível, tornando-o, portanto, desnecessário. Isso se deu mediante a mitigação do atual regime de preclusões, que permitirá à parte prejudicada apresentar, junto com a apelação, toda a sua irresignação acumulada durante o trâmite do processo em primeiro grau.

Esse modelo substituiria o atual, em que cada discordância gera um agravo retido a deflagrar inutilmente um micro-procedimento incidental que somente será julgado junto com a eventual apelação, postergando a decisão final.

Segundo, quanto à apelação, o projeto transforma o atual efeito suspensivo ope legis em ope iudicis, à semelhança do que ocorre hoje com o agravo de instrumento, no qual é o relator no tribunal, à vista do caso concreto, e não a lei em abstrato, quem concede ou denega o efeito suspensivo.

Como o juízo de admissibilidade da apelação passaria a ser realizado diretamente pelo tribunal ad quem, e não pelo juízo inferior, não haveria retardamento na remessa dos autos e exame de eventual pedido de efeito suspensivo, o que, em caso de indeferimento, anteciparia em muito o início da execução provisória, prestigiando o autor que tem razão. Com isso, perde o réu contumaz, que detém hoje a apelação como instrumento fácil e gratuito de postergação do cumprimento de suas obrigações.

Ademais, para que o debate seja estabelecido em bases racionais, não se pode ocultar que no sistema vigente as tutelas de urgência, concedidas em cognição sumária, isto é sem maior aprofundamento, já comportam execução provisória. O que, então, justificaria que uma sentença, proferida após o amplo exercício do direito de defesa, possua menos valor que uma decisão interlocutória? Trata-se de um paradoxo do sistema atual que precisa ser analisado sem paixões.

Não obstante essas falácias que investem na desinformação para convencer (ou atemorizar) o grande público, inúmeras críticas fundadas em preocupações legítimas e razoáveis têm sido veiculadas, o que é fundamental para se chegar ao melhor texto para o País.

Essas contribuições têm recebido enorme atenção do presidente e do relator-geral da Comissão Especial que analisa o projeto do novo CPC, deputados Fábio Trad e Sergio Barradas Carneiro, demonstração eloqüente da vocação democrata de ambos, e do elevado espírito público que possuem.

*Bruno Dantas é conselheiro do CNJ, mestre e doutorando em Direito Processual Civil (PUC-SP).

Observação: Como se trata de opinião pessoal, o texto não reflete necessariamente apurações ou argumentos da OAB/DF.

A isenção do Imposto Sobre Serviços (ISS) para os advogados autônomos

O advogado Joaquim de Campos Martins faz uma breve reflexão sobre os eventuais custos financeiros a serem suportados por quem pretende seguir a carreira advocatícia e sugere a isenção do ISS para os que atuam como autônomos no Distrito Federal.

Confira o artigo (clique aqui).

Observação: Como se trata de opinião pessoal, o texto não reflete necessariamente apurações ou argumentos da OAB/DF.