A advocacia não é uma simples profissão, é uma atividade destinada a proteger, preservar e resgatar os direitos individuais. Como o Judiciário age somente mediante provocação, disto decorre ser o advogado indispensável à administração da Justiça, tal como determina a Constituição da República Federativa do Brasil, que estatui em seu artigo 133: “o advogado é indispensável a administração da justiça (…)”.
Portanto, trata-se de função essencial por expressão constitucional, colocando a advocacia em paridade com a magistratura, o Ministério Público, a Defensoria Pública. Tal paridade provem da assegurada garantia de ser o advogado inviolável em seus atos e manifestações, nos limites da lei, enquanto estiver no exercício profissional, como dispõe a parte final do referido dispositivo constitucional.
Assim o sendo, tal garantia constitucional é assegurada até este expresso limite, o de legalidade deste exercício profissional, tornando a advocacia intocável, que não pode ser agredida enquanto efetiva e legalmente exercida, decorrendo esta inviolabilidade das garantias que asseguram a existência e a permanência do próprio Estado Democrático de Direito, por meio das esculpidas garantias das liberdades individuais, coletivas e difusas previstas dentro do próprio sistema constitutivo deste mesmo Estado.
Esta mesma garantia é assegurada a membros do Poder Legislativo: deputados federais, senadores, deputados estaduais e vereadores permanecem invioláveis pelas suas opiniões, palavras e votos, quando do exercício do mandato legislativo.
Por força de sistema constitucional, o advogado é inviolável por seus atos e manifestações, em juízo e fora dele, cuja proteção é repelir o autoritarismo impeditivo do exercício da advocacia, garantindo o direito à ampla defesa e ao pleno contraditório. À luz da Constituição em seu artigo 5º, incisos: X, XII e XIII, asseguram direitos e garantias fundamentais, in verbis:
X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;
(…);
XII – é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal;
XIII – é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer;
Além da previsão Constitucional, tem-se ainda o Estatuto da Advocacia (Lei Federal 8.906, de 04 de julho de 1994) que regulamenta o exercício da advocacia, cujo artigo 2º, §3º, e artigo 7º, inciso II, preveem de forma expressa e taxativa a inviolabilidade profissional pelos atos e manifestações do advogado.
Artigo 2º O advogado é indispensável à administração da justiça.
(…);
§ 3º No exercício da profissão, o advogado é inviolável por seus atos e manifestações, nos limites desta lei.
Artigo 7º São direitos do advogado:
(…);
II – a inviolabilidade de seu escritório ou local de trabalho, bem como de seus instrumentos de trabalho, de sua correspondência escrita, eletrônica, telefônica e telemática, desde que relativas ao exercício da advocacia;
Em que pese a clareza do artigo 133 da Constituição e, de igual, dos termos da Lei Federal 8.906, de 04 de julho de 1994, diversas formas de agressões sofridas contra esta inviolabilidade tem sido observadas, tal como, por exemplo, as buscas e apreensões em escritórios de advogados, a investirem contra o direito de exercer a profissão visando à obtenção de dados e elementos indiciários ou de prova contra clientes investigados atingindo de viés, o sigilo de outros clientes daquele escritório violado. Assim, tal ato estatal, além de agredir a inviolabilidade mencionada, agride também o sigilo profissional, cuja indispensabilidade é parte integrante da boa defesa do cliente.
Por esta razão, no Brasil, muito vezes é necessário afirmar e reafirmar o óbvio. Assim, aumentando ainda mais, a blindagem denominada inviolabilidade profissional do advogado, já que não se trata de privilégio algum em favor deste, bem ao contrário, pois que em favor das liberdades individuais do povo, da sociedade como um todo.
O elo de ligação entre o cidadão e o Poder Judiciário, buscando a aplicação adequada da lei, via advogado, foi introduzida pela Lei 11.767, publicada em 8 de agosto de 2008, denominada Lei da Inviolabilidade do Direito de Defesa, que visa proclamar a liberdade do cidadão em seu direito de defesa.
A edição, promulgação e publicação desta lei traz em si finalidade específica, qual seja, é lei delimitadora do Poder Estatal, a limitar o poder do Príncipe, em razão da máxima medieval: “diante da justiça do soberano, todas as vozes devem-se calar”.
Não olvidar que já naquela época os processos criminais eram secretos, não só para o público, mas, principalmente, para o acusado, predominando a vontade do soberano, cujo poder se constituía, sozinho, num único sistema: acusava, interrogava, sentenciava e executava a pena; prevalecendo a sua vontade transmudado o direito em único, absoluto e exclusivo, expressão da vontade unilateral do príncipe, instrumento de opressão e de manutenção do status quo.
De feita que a história demonstra que o direito de defesa é fruto da evolução humana como fenômeno civilizatório. Dizia Ruy Barbosa: “o primeiro advogado foi o primeiro homem que, com a influência da razão e da palavra, defendeu os seus semelhantes contra a injustiça, a violência e a fraude”[1].
De não se olvidar também que o Direito, como fenômeno social e civilizatório, antes constituído como preservador de privilégios dos senhores, ao longo das eras, passou a equalizar valores juridicamente protegidos a modo de nivelar direitos e deveres dos cidadãos agregados sob o manto do Estado, como resultante do pacto social, a mó de garantir a governabilidade, promovendo a paz social, coibindo a autotutela.
Garantiu-se, pois, para este fim, o exercício do direito de defesa, tão necessário para a segurança jurídica, e esta foi a razão primordial do advento da Lei 11.767, de 2008. Vejamos:
O legislador levou em consideração à necessidade de regulamentar a via excepcional de produção de prova, as apreensões em escritórios de advocacia. Segue, in verbis, o texto da referida lei.
LEI Nº 11.767, DE 7 DE AGOSTO DE 2008
DOU 08.08.2008
Altera o art. 7º da Lei nº 8.906, de 4 de julho de 1994, para dispor sobre o direito à inviolabilidade do local e instrumentos de trabalho do advogado, bem como de sua correspondência.
O VICE-PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no exercício do cargo de PRESIDENTE DA REPÚBLICA.
Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1º – O art. 7º da Lei nº 8.906, de 4 de julho de 1994, passa a vigorar com a seguinte redação:
“Art. 7º.
(…).
II – a inviolabilidade de seu escritório ou local de trabalho, bem como de seus instrumentos de trabalho, de sua correspondência escrita, eletrônica, telefônica e telemática, desde que relativas ao exercício da advocacia;
(…)
§ 5º. (VETADO)
§ 6º. Presentes indícios de autoria e materialidade da prática de crime por parte de advogado, a autoridade judiciária competente poderá decretar a quebra da inviolabilidade de que trata o inciso II do caput deste artigo, em decisão motivada, expedindo mandado de busca e apreensão, específico e pormenorizado, a ser cumprido na presença de representante da OAB, sendo, em qualquer hipótese, vedada a utilização dos documentos, das mídias e dos objetos pertencentes a clientes do advogado averiguado, bem como dos demais instrumentos de trabalho que contenham informações sobre clientes.
§ 7º. A ressalva constante do § 6º deste artigo não se estende a clientes do advogado averiguado que estejam sendo formalmente investigados como seus partícipes ou co-autores pela prática do mesmo crime que deu causa à quebra da inviolabilidade.
§ 8º (VETADO).
§ 9º (VETADO).
Art. 2º. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Quando as buscas e as apreensões, cuja produção de prova é excepcional, venham a recair em escritórios de advocacia de forma corriqueira e abusivamente, mesmo quando o advogado não suspeito de prática criminosa venha a ser atingido, é ato coibido pelo teor desta lei.
Da mesma forma, as interceptações telefônicas e as escutas ambientais implementadas no local de trabalho do advogado, desrespeitando a sua privacidade, a sua inviolabilidade, o sigilo constitucional e legal que deve existir entre advogado e seu constituinte, restam coibida pelo teor da lei mencionada.
Se, antes da lei referida, portarias prevaleciam diante do texto constitucional e da lei federal (EOAB), como, de resto, a Portaria 1.288, de 30 de junho de 2005, emanada do Ministério da Justiça, regulamentando as instruções de procedimento nas execuções de diligências da Polícia Federal nos cumprimentos de mandados judiciais, de busca e apreensão em escritórios de advocacia, agora não mais ocorre.
Neste sentido, o texto legal reafirma que qualquer ato administrativo não pode sobrepor aos preceitos fundamentais e ao ordenamento legislativo federal por ser, simplesmente, não só inadmissível, mas cabalmente contrário a todo o ordenamento.
De feita que se reafirmou ser o Direito de Defesa, direito elementar e vital, inerente a dignidade da pessoa humana, pois, ao reconhecer este direito de defesa, pelo texto legal, se garante ulteriormente que qualquer cidadão, não veja divorciado este direito do elo constitucional assegurado junto poder estatal quanto ao crivo deste no pronunciamento de seu direito, ou ausência deste.
Assim, o Direito de Defesa constitui o pleno equilíbrio democrático entre o cidadão e o estado. Por conseguinte, só haverá este equilíbrio se houver seguridade quando do reconhecimento pleno e eficaz da inviolabilidade do exercício liberto e legal da advocacia.
Esta inviolabilidade do Direito de Defesa, além da previsão legal e constitucional, também está prevista de forma expressa no Pacto de Direitos Humanos de San José da Costa Rica (Convenção Americana de Direitos Humanos), em seu artigo 8º, 2º, d, in verbis:
(…).
2.
Toda pessoa acusada de delito tem direito a que se presuma sua inocência enquanto não se comprove legalmente sua culpa. Durante o processo, toda pessoa tem direito, em plena igualdade, às seguintes garantias mínimas:
(…)
d)
direito do acusado de defender-se pessoalmente ou de ser assistido por um defensor de sua escolha e de comunicar-se, livremente e em particular, com seu defensor;
Na Declaração Universal de Direitos Humanos, em seu artigo XI, 1, in verbis:
(…)
1. Toda pessoa acusada de um ato delituoso tem o direito de ser presumida inocente até que a sua culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei, em julgamento público no qual lhe tenham sido asseguradas todas as garantias necessárias à sua defesa.
Os tratados internacionais e convenções dos quais o Brasil é signatário, dentre estes, os mencionados, foram recepcionados no ordenamento pátrio. Portanto verifica-se que o Direito a Defesa não é um privilégio para os advogados, pois que deriva de condição legal prevista no sistema jurídico brasileiro, remanescendo a inviolabilidade decorrente destas condições legais e constitucionais citadas.
A inviolabilidade para o advogado é dever a ser observado, sob pena de assim não sendo constituir infração ética e disciplinar, por expressar garantia individual, em última análise, do cidadão, o qual não poderá ser investigado, acusado e julgado sem a presença de um defensor sob a égide do Estado Democrático de Direito, que não pode retirar do cidadão este direito de se defender em plenitude.
Evidente que este direito de defesa exercido no rigor da inviolabilidade não é absoluto. O próprio texto constitucional aliado à lei federal que estatui a advocacia, assim estabelece o exercício da profissão, ao fazer menção aos “limites da lei” e “nos limites desta lei”. Não serve, pois, a inviolabilidade para proteger advogado criminoso, cujo direito penal recairá sobre sua conduta delituosa.
Contrário senso, não se pode confundir ser o advogado responsável pelo direito de defesa encarnado no próprio criminoso, por este constituído com o fito de defendê-lo em qualquer sede, tribunal ou instância. O advogado que comete crime, pratica atividade incompatível com a advocacia, e nesta condição se sujeita aos rigores da lei, podendo e devendo ser investigado e punido.
Por esta razão é que se admitem as busca e as apreensões em escritório de advocacia, visando investigar e punir os criminosos travestidos de advogados, pois que estes não podem se valer dos escritórios de advocacia para servirem de “depósitos de crimes”. Assim, em havendo indícios da prática de crimes por parte de advogados e seus clientes, conjuntamente, a inviolabilidade pode e deve ser quebrada.
O propósito primordial da Lei nº 11.767, de 2008, é proteger advogados que pautam suas condutas dentro dos estritos limites legais quando do exercício de suas atividades, por um lado, e, por outro, regulando a apuração, possibilitar a legalidade das investigações servente a poder se acusar, processar, julgar e, ao final, condenar os maus advogados que se escudam ilicitamente sob o manto de uma prerrogativa profissional, sem prejuízo de aplicação de sanções disciplinares que podem conduzir à expulsão do quadro da Ordem, cassando em definitivo a inscrição.
Mas como fazer valer a sagrada garantia da Inviolabilidade Direito de Defesa? Basta aplicar de forma efetiva a Lei da Inviolabilidade do Direito de Defesa. A referida lei só fez integrar no rol de direitos e prerrogativas profissionais do advogado (artigo 7º, incisos e parágrafos, do Estatuto), a inviolabilidade e a indispensabilidade em razão do cargo e função que é essencial à proteção do desempenho da atividade profissional.
Em 2006, o STF, ao julgar as ADIns 1127 e 1105 considerou este tema – “inviolabilidade” – dentre outros, constitucional, a luz da Constituição e do próprio EAOAB, como por exemplo, a prisão em Sala de Estado-Maior e ou prisão domiciliar antes do transito em julgado de condenação definitiva. Isto nada mais é do que a prisão cautelar em detrimento do Princípio da Não-Culpabilidade (artigo 7º, V da EAOAB), afastando, assim, interpretações equivocadas do texto de lei.
A nova redação do inciso II, do artigo 7º, da Lei da Advocacia, não deixa dúvida. Não cabe mais quebra da inviolabilidade do escritório de advocacia ou do local de trabalho do advogado, bem como de seus instrumentos de trabalho, de sua correspondência escrita, eletrônica, telefônica e telemática, evidentemente quando condicionada ao exercício da advocacia dentro dos limites legais. Esta inviolabilidade impossibilita o persecutio criminis aleatório, arbitrário, do Estado, garantindo a liberdade e a autonomia do advogado dentro de seu ministério privado em razão do cargo e da função, protegendo assim o cidadão, a sociedade e, ao final, o Estado Democrático de Direito.
Como já citados por diversos autores e precedentes jurisprudenciais, o advogado, nos limites de seu exercício profissional, não pode ser responsabilizado perante o Estado pelos seus atos e manifestações, e seus excessos estão vinculados diretamente ao seu órgão disciplinador.
A denominada Lei da Inviolabilidade do Direito de Defesa para ser eficaz, faz necessário estarem presente as seguintes condições objeto da tutela: a) ser advogado; b) estar no exercício profissional; c) integrar local de trabalho ou escritório de advocacia; d) manejar correspondência escrita; e) ser o titular de seus instrumentos de trabalho; f) efetivar comunicação telefônica e da telemática no exercício da profissão.
Portanto, além de necessário estar o advogado inscrito no quadro da OAB, deve seus atos e opiniões estar conectados diretamente ao regular exercício da advocacia, representando interesses alheios, em qualquer órgão da administração público, direta ou indireta.
Por local de trabalho ou escritório de advocacia se entende todo espaço físico ou virtual ocupado para o livre exercício profissional, possua ou não a expressão indicativa de se tratar de escritório, de forma definitiva, temporária ou esporádica.
O conceito abrange também o local de trabalho, os departamentos jurídicos de órgãos públicos e empresas, as salas existentes nos fóruns, que são utilizadas para o atendimento de clientes e atividades corriqueiras da profissão, bem como a residência do advogado utilizada como principal ou complementar às suas atividades profissionais, os denominados escritórios/residências.
Por correspondências escritas, podem estas ser cartas, bilhetes, telegramas ou qualquer outro meio de comunicação escrita. Instrumentos de trabalhos são os computadores, agendas, pastas etc. A comunicação telefônica nada mais é do que o diálogo entre advogado e cliente por qualquer meio, inclusive a telemática, ligada a informática. Presentes estas condições a inviolabilidade não pode ser quebrada, não sendo a regra absoluta, havendo as exceções admitidas, como abordado adrede.
E no acrescido § 6º, do artigo 7º, do Estatuto, estabelecida foi a hipótese autorizadora da quebra da inviolabilidade do direito de defesa quando há desvio na conduta advogado, quando este excede o limite de suas prerrogativas e sua conduta passa a ser criminosa, ainda que como co-autor ou partícipe.
Assim dispõe o § 6º, do artigo 7º, do Estatuto:
“Presentes indícios de autoria e materialidade da prática de crime por parte de advogado, a autoridade judiciária competente poderá decretar a quebra da inviolabilidade de que trata o inciso II do caput deste artigo, em decisão motivada, expedindo mandado de busca e apreensão, específico e pormenorizado, a ser cumprido na presença de representante da OAB, sendo, em qualquer hipótese, vedada a utilização dos documentos, das mídias e dos objetos pertencentes a clientes do advogado averiguado, bem como dos demais instrumentos de trabalho que contenham informações sobre clientes”.
Extrai-se do referido dispositivo ser necessária a presença de alguns requisitos essenciais cumulativos para validar a ordem judicial, sob pena de torná-la nula (prova ilícita), quais sejam: 1) indícios suficientes de autoria e de materialidade da prática de crime por parte de advogado; 2) a expedição de medida de ordem judicial e a razoável motivação da decisão que decretou a quebra da inviolabilidade; 3) expedição de mandado de busca e apreensão, desde que específico e pormenorizado; 4) a presença, quando da realização da diligência, de representante da OAB; 5) o estabelecimento e rigorosa observância dos limites de abrangência do mandado judicial.
Em havendo indícios (artigo 239, do CPP[2]) de autoria (indiciamento) onde fique demonstrada a qualidade de autor, co-autor ou partícipe de um delito aliado à presença da materialidade delitiva, poderá o ato judicial começar a ter razoável motivação para a quebra da inviolabilidade, e, por ser medida excepcional, extremada, seu objetivo se faz para fins exclusivamente criminais (investigações e ou instrução processual penal). Por se tratar da quebra de uma garantia constitucional, necessário que o ato formal da decisão judicial seja plenamente motivado e fundamentado (inciso IX, art. 93, da Constituição, e, art. 240, § 2º, do CPP).
Uma vez instrumentalizada a ordem judicial pela via do mandado de busca e apreensão, necessário ser este restrito, específico, discriminativo, minudente, sobre qual local recairá, nomeando qual o advogado será atingido pela medida e, sobre quais objetos incidirá a medida de buscar e apreender, sobre quais instrumentos e coisas se fará a diligência, tudo, sempre, acompanhado de um representante da OAB local, cuja obrigação legal será a de fazer observar os requisitos para o cumprimento do mandado judicial.
A atuação deste mandatário da OAB, presente à integralidade da diligência, acompanhará atento escrito o quanto ocorre no curso da busca e apreensão, e, em caso de ilegalidade ou discordância, poderá assim julgar, inclusive, necessário retirar-se do local para não validar ato manifestamente ilegal, devendo incontinente comunicar o responsável pelas diligências e posteriormente, por relatório minudente e escrito, à autoridade competente.
Os limites da abrangência do mandado judicial consistem na vedação de abranger os documentos, as mídias e os objetos pertencentes aos clientes do advogado averiguado, bem como de demais instrumentos de trabalho que contenham informações sobre os clientes do advogado averiguado, já que nenhum objeto poderá ser apreendido, salvo constituírem elementos de corpo de delito (artigo 243, § 2º, CPP), sob pena de não ter qualquer valor probatório a prova obtida através da quebra da inviolabilidade ilegal, face à vedação expressa de texto de lei.
Como explanado anteriormente, como toda a regra não é absoluta, admitindo exceção, fica ressalvado a vedação no caso de cliente de advogado averiguado que esteja sendo também investigado pela prática do mesmo crime que deu causa a quebra da inviolabilidade, desde que suficientes os indícios de autoria e de materialidade delitiva, observados também todos os requisitos essenciais retro analisados. Segue in verbis o § 7º, do artigo 7º, do Estatuto da OAB, a respeito:
§ 7º – A ressalva constante do § 6º deste artigo não se estende a clientes do advogado averiguado que estejam sendo formalmente investigados como seus partícipes ou co-autores pela prática do mesmo crime que deu causa à quebra da inviolabilidade.
Daí a premissa de que a Lei da Inviolabilidade do Direito de Defesa não protege o advogado criminoso e não protege o escritório do advogado e seus instrumentos de trabalho para fins que se destinam à prática de crime.
Contudo, o fato do advogado, nos limites de sua atuação e competência, ter acesso aos documentos e instrumentos cujo cliente utilizou para prática de um delito, não pode o advogado, por dedução óbvia, ser considerado co-autor ou partícipe de tal delito, excepcionando, neste caso, a aplicabilidade da lei.
Assim, a Lei 11.767/08, passa a ser instrumento de plena preservação do sigilo que deve presidir as relações entre o cliente e o advogado, face à sua indispensabilidade integrativa ao sistema vigente, em observância ao devido processo legal, tangente à inviolabilidade quanto ao cumprimento pleno de sua capacidade postulatória, tudo assegurado pela Constituição e pela Lei Federal Estatutária.
Por conseguinte, o descumprimento da Constituição e da Lei da Advocacia assegura ao ofendido o direito à justa indenização, caso haja divulgação de notícias envolvendo o seu nome, do advogado ou de seu cliente, sem prejuízos da responsabilidade administrativa e criminal, tal como prevê a Lei nº 4898/65, que regula o direito de representação e o processo de responsabilidade administrativa civil e penal nos casos de abuso de autoridade.
Vale ressaltar que se encontra em tramite um projeto de lei (Projetos de Lei nº 4.915 e nº 5.762, ambos de 2005 da Câmara dos Deputados e PLC nº 83, de 2008 do Senado Federal), que criminaliza a violação das prerrogativas dos advogados que, em caso de aprovação, blindará a garantia da inviolabilidade do direito de defesa a ser utilizado em favor do pleno exercício da advocacia.
Bibliografia:
Cartilha de Prerrogativas – Comissão de Direitos e Prerrogativas 1ª. e 2ª. Edição, 2008 e 2009 Editora LEX, 2008 e 2009;
A Inviolabilidade do Direito de Defesa, Cezar Brito e Marcus Vinicius Furtado Coêlho, 2ª. Edição, Editora Del Rey, 2009;
Revista do Advogado – Ética e Prerrogativas do Advogado – AASP, 2007;
Prerrogativas Profissionais do Advogado, Alberto Zacharias Toron e Alexandra Lebelson Szafir, OAB/Editora, 2006;
Estatuto da Advocacia, Comentários e Jurisprudência Selecionada, Gisela Gondim Ramos, OAB-SC/Editora, 1999;
Comentários ao Estatuto da Advocacia e da OAB, Paulo Luiz Netto Lôbo, Editora Saraiva, 2002;
A Advocacia e a Ordem dos Advogado do Brasil, Gladston Mamede, Editora Sintese, 1999;
As Misérias do Processo Penal, Francesco Carnelutti, traduzido por por José Antonio Cardinalli, 2ª. Edição, Editora Bookseller, 2002
Notas
[1] SODRÉ, Ruy Azevedo, apud Rui Barbosa, A Ética Profissional e o Estatuto dos Advogados, São Paulo, LTr, p. 267.
[2] Art. 239. Considera-se indício a circunstância conhecida e provada, que, tendo relação com o fato, autorize, por indução, concluir-se a existência de outra ou outras circunstâncias.
*Marco Aurélio Vicente Vieira é advogado criminal e vice-presidente da Comissão de Direitos e Prerrogativas da OAB-SP