*Wílon Wander Lopes
Trinta anos atrás, em 1987, foi instalada em Brasília, novíssima capital do Brasil, a tão sonhada Assembléia Nacional Constituinte, a grande reunião política que todos os brasileiros pediam, inclusive no icônico movimento das Diretas Já!
Esta moderna odisséia começou com a histórica Emenda Constitucional 25, de 1.985, que também resgatou ao novo Distrito Federal o Direito de Voto, campanha cidadã que começou em Taguatinga, a cidade que nasceu em 1958, a partir da desobediência civil dos candangos pioneiros, revoltados com a ordem dos governantes de então no sentido de, concluída a construção de Brasília, serem obrigados a voltar às suas terras de origem.
Liderada por advogados e empresários cansados do descaso com que eram tratadas as chamadas cidades-satélites (que só recebiam sobras, enquanto o Plano Piloto, sede da capital federal, recebia tudo de bom), a campanha era legítima, por isso tinha tudo para dar certo – é que todos os brasileiros tinham o Direito de Voto, menos os moradores da recém construída Brasília e do nascente Distrito Federal. Uma ignomínia!
O que fazer? Se o poder era concentrado no governador, imposto pelo presidente imposto, era preciso trazer, também para o Distrito Federal, o poder do povo – o voto. Assim, seria reparada tal ignomínia, transformando os habitantes daqui em cidadãos, como são os moradores de todas as demais cidades brasileiras, que votam, é preciso repetir, menos os das que constituíam o incipiente Distrito Federal.
Para isso, com todo o vigor e empenho do interesse cívico, uniram-se advogados e empresários, a principio em Taguatinga, na Associação dos Advogados de Taguatinga e na ACIT, Associação Comercial e Industrial de Taguatinga, depois na OABDF e na ACDF – Associação Comercial do Distrito Federal, presidida pelo advogado e empresário Lindberg Cury, depois Senador, para lutar pelo direito básico da Cidadania de Brasília e do Distrito Federal – o voto.
A falta do Direito de Voto para os moradores do DF era, de fato, num contexto de um país democrático, uma capitis diminutio, como disse Tancredo Neves. Ele também aderiu à campanha, quando respondeu a uma pergunta que eu lhe fiz, na OAB-DF, com relação ao resgate da representação política para o DF, um direito que já tinham os cidadãos do Rio de Janeiro, a capital do Brasil antes de Brasília: “Conheço cidadãos cassados, conheço grupos cassados, mas cidade cassada só conheço Brasília!”
E foi vitoriosa a campanha. Em 1986, pela primeira vez no novo Distrito Federal, eram eleitos seus representantes políticos: os três senadores e os oito deputados federais que iam participar da Assembléia Nacional Constituinte. Brasília deixava de ser um QG das Forças Armadas, no tempo do regime militar, para se transformar na sede da mais importante reunião dos brasileiros, vindos de todos os rincões para construir, aqui, um moderno e eficaz Estado Democrático de Direito.
E tudo funcionou muito bem. Produto da Assembléia Nacional Constituinte, a Constituição de 1988 reafirmou não só a nossa representação federal, mas também ganhamos a eleição de governador e de vinte e quatro deputados distritais, com a criação da inédita Câmara Legislativa do Distrito Federal, uma mistura de Câmara de Vereadores, como existe em todos os municípios, e de Assembléia Legislativa, como existe em todos os Estados.
Em tal obra cívica, é importante registrar as participações de três ilustres e ativos advogados de Brasília, cujo trabalho foi indispensável para insculpir nosso Direito de Voto na Constituição de 1988: Sepúlveda Pertence, na Comissão Afonso Arinos (formada por notáveis juristas brasileiros reunidos nela pelo então Presidente do Brasil, José Sarney, a qual preparou para os constituintes uma espécie de minuta da Constituição); Maurício Corrêa, ex-presidente da OAB-DF, no Senado Federal; e Sigmaringa Seixas, na Câmara dos Deputados, todos cuidando – e muito bem – dos interesses do DF.
Durante a Constituinte, na nova capital do Brasil, a maior obra dos brasileiros, em todos os tempos, concretizada sob a liderança do inesquecível Juscelino Kubitschek, os políticos provaram que eram capazes de reconstruir o Brasil, sem guerra, perdoando, com a Lei da Anistia, os que se excederam. Era tempo de união para a reconstrução de um Brasil para o futuro, em clima de elogiável concórdia cidadã…
Hoje, como é público e notório, a representação política, aqui tão duramente conquistada, está em um patamar deplorável. Fala-se até em nova intervenção militar, também surgindo candidatos radicais, pregando o nós contra eles, com boa aceitação nos dois casos, o que significa dizer que muitos cidadãos parecem não acreditar mais na via política para a solução dos problemas do Brasil. Estamos mesmo em um clima de descrédito para com a política e para com os políticos.
Em termos de Cidadania, isso é péssimo! Um absurdo no contexto de um Estado Democrático de Direito! Por isso, quando fatos tão importantes chegam à casa dos trinta anos, mostrando que a política, única alternativa à guerra, já provou, aqui no Planalto Central, que é a forma civilizada de resolver problemas, é preciso celebrar as duas vitórias de Brasília – Distrito Federal: a conquista do seu Direito e Voto e a competência para sediar a sonhada e bem sucedida Assembléia Nacional Constituinte.
Há trinta anos, Brasília foi testada e mostrou sua competência para ser de fato e de direito a Capital Federal. Como entidade acreditada, sempre voltada para o império da lei, é tempo para que a OAB-DF, que tanto se empenhou para a volta da Democracia para o Brasil, bem como para a conquista do Direito de Voto para o DF, convoque outras entidades da sociedade civil de Brasília e de suas regiões administrativas, em todo o DF, para celebrar os 30 anos da Constituinte, mostrando o exemplo que, em Brasília, nosso Brasil deu ao mundo – um Estado Democrático de Direito, construído em clima de concórdia, e uma Constituição Cidadã!.
(*) Wílon Wander Lopes, advogado, vive no Distrito Federal desde 1959. Foi candidato à Presidência da OAB-DF (1976), e, por duas vezes, Conselheiro da entidade. Iniciou e liderou a campanha pelo resgate do Direito de Voto para os cidadãos do Distrito Federal. Foi o Primeiro Presidente da OAB de Taguatinga, onde também iniciou e liderou a campanha pela descentralização da Justiça do DF. É presidente da Confraria dos Cidadãos Honorários de Brasília e Diretor do JORNAL SATÉLITE (51 anos dedicados a Taguatinga)
Imagem – Causa Operária