Clientes praticamente não têm a quem recorrer em caso de uma disputa judicial. Leandro Pamplona, advogado membro da Comissão de Direito dos Jogos do Ordem dos Advogados (OAB) do Distrito Federal, afirma que se a aposta é feita dentro do Brasil, ainda que em site estrangeiro, é possível procurar a justiça brasileira
O número de queixas de clientes contras sites de aposta em jogos esportivos explodiu no Brasil durante a pandemia. Os dados do site Reclame Aqui são acachapantes: o Sportingbet teve aumento de 166% (1.725 em 2020 e 4.592 em 2021); Betfair de 115% (227 em 2020 e 490 em 2021); o Bet365 de 119% (2580 em 2020 e 5673 em 2021); e Betano de oito reclamações em 2020 para 859 em 2021.
Embora as empresas operem no Brasil nenhuma delas têm CNPJ, o que torna um problema para o usuário do serviço caso se sinta lesado que queira acionar as empresas na Justiça.
As empresas se mantém fora do país para que não sejam enquadradas na Lei de Contravenções Penais, que proíbe as apostas e jogos de azar.
Tradicional no mundo das apostas, o Reino Unido é sede da Bet365, Spotingbet e Betfair; a Betano tem suas raízes na Grécia. Já outras têm endereços menos tradicionais: Curaçao. A ilha caribenha abriga Amuletobet, Casa de Apostas, Galera.bet e Pixbet.
Ao mesmo tempo em que cuidam para não ter sede aqui, as empresas têm a necessidade de serem sediadas no exterior em países onde o jogo é regulamentado. Lucas Oliveira, representante da empresa de marketing esportivo Epicplay, explicou o imbróglio em artigo publicado no portal Consultor Jurídico.
“Vale lembrar que a atividade só é legalizada atualmente, se for explorada por empresas que são sediadas em outros países, onde as apostas já são totalmente regulamentadas. Portanto, ainda não há nenhuma empresa de apostas esportivas totalmente nacional que atue regularmente dentro do mercado brasileiro”, disse.
Queixas contra Bet365, Sportingbet, Betfair e Betano
Um problema recorrente relatado pelos clientes da Bet365 é que o depósito feito via banco tradicional não se espelha na conta da plataforma. Junto com isso, muitas reclamações de falta de atendimento ao cliente, tentativas frustradas de falar com algum representante da empresa.
A companhia não tem dado nenhuma resposta nas reclamações mais recentes.
Essas mesma reclamações e outras de apostas ganhas que não foram pagas ocorrem com a Sportingbet, mas a empresa tem outro jeito de lidar. Responde quase todos os comentários e, pelo menos ao que parece, trata dos casos por e-mail de forma individualizada e não com um padrão genérico para todos.
Já a Betfair nunca respondeu nenhum comentário no Reclame Aqui. Depósitos não creditados e dificuldades com saque são muito citados.
A Betano também nunca respondeu nenhum cliente. E as reclamações giram entorno dos mesmos temas, de dinheiro não espelhado na conta, saques dificultados, falta de comunicação.
Dificuldade para clientes acionarem empresas
Mas como ficam os milhares de consumidores que sentem lesados e expressam isso em sites como o Reclame Aqui? Leandro Pamplona, advogado membro da Comissão de Direito dos Jogos do Ordem dos Advogados (OAB) do Distrito Federal, afirma que se a aposta é feita dentro do Brasil, ainda que em site estrangeiro, é possível procurar a justiça brasileira.
“Caso o apostador não receba o prêmio ou ainda tenha seus dados indevidamente compartilhados (ex. cartão de crédito) esse deverá entrar imediatamente em contato por chat, suporte on line ou call center disponibilizado pela plataforma”, afirma.
Porém, se ninguem responder, a situação dá um salto de complexidade. O membro da OAB-DF afirma se o cliente não conseguir contato, ele deverá fazer uma reclamação no IBAS (Independent Betting Adjucation Service). Essa é uma plataforma inglesa de ADR (alternative dispute resolution) aprovada pela Gambling Commission para realizar uma mediação ou conciliação sobre disputas que surjam entre as casas de apostas e seus clientes.
“É uma tentativa extrajudicial de resolução do conflito que tem bom percentual de resultado”, afirma.
Por último, poderia ingressar na Justiça brasileira. “O problema dessa última opção seria a dificuldade na citação da casa de apostas, normalmente sediada no exterior, e depois a busca por patrimônio. No entanto, existem diversas ações já propostas”, ressalta.
Apostas online no limbo jurídico
A prática vive um limbo jurídico no país. A Lei 13.756 de dezembro de 2018 autorizou as “apostas de quota fixa” e estabeleceu que os impostos coletados da atividades devem ir para o Ministério da Educação e seguridade social.
A lei foi assinada durante a presidência de Michel Temer e prevê que uma regulação seja aprovada com maiores detalhes em quatro anos, ou seja, até dezembro deste ano.
Ao Portal do Bitcoin, o advogado Pamplona resumiu o panorama caso a lei de Temer não seja atualizada: “São três cenários: fica tudo como está, termina tudo, ou medidas judiciais serão tomadas para que mantenham como está até chegar a regulamentação”, diz o advogado, que é sócio do escritório Bonetti, Krugen & Pamplona Advogados.
Reportagem do jornal El País de setembro de 2021 apurou que existiam 450 sites ativos de apostas no Brasil, movimentando R$ 12 bilhões anualmente.
Bet365, Sportingbet, Betfair, Betano e futebol
Em 2022, o movimento de domínio do patrocínio do futebol brasileiro pelos sites de apostas se consolidou ainda mais: pesquisa do Ibope Repucom divulgada em janeiro deste ano pela ESPN mostra que o setor desbancou o mercado financeiro tradicional na compra de espaço nos uniformes das equipes.
Betano patrocinou em 2021 o campeão brasileiro Atlético Mineiro e o Fluminense; Sportingbet patrocina o São Paulo, o Galera.bet estampou a camisa do Sport, o Pixbet o América Mineiro, a Amuletobet o Atlético Goianiense e a Casa de Apostas o Bahia. Ao todo foram sete patrocínios.
Já o setor financeiro tradicional marcou presença em seis uniformes: Grêmio, Internacional, Juventude (todos com o Banrisul), Flamengo (BRB), Palmeiras (Crefisa) e Santos (Sum Up).
Para se ter uma ideia da força, em julho do ano passado o São Paulo Futebol Clube, que possui a terceira maior torcida do país, anunciou que o acordo de patrocínio com a Sportingbet era até aquele momento o maior feito na história do clube, conforme noticiou o portal Terra. O contrato tem três anos e meio de validade.
Na quinta-feira (24), o Santos anunciou que o novo patrocinador master da sua camisa será a PixBet, substituindo a SumUp. Ocorreu até um congestionamento: a empresa tinha uma patrocínio nas mangas da camisa da Dafabet, mas que irá sair agora por ser concorrente direto do principal patrocinador.
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