Nota Pública: TSE precisa analisar a participação das mulheres nas direções partidária

No dia em que se comemora o Dia Internacional das Mulheres do ano de 2020, a Ordem  dos Advogados do Brasil do Distrito Federal, a partir de sua Comissão de Direito Eleitoral, vem a público destacar a necessidade de o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) apreciar a consulta n. 0603816-39.2017.6.00.0000, que objetiva aumentar a participação das mulheres nos órgãos de direção dos partidos políticos.

Essa consulta foi apresentada pela Senadora Lídice da Mata, a partir de estudo jurídico da Clínica de Direito Constitucional do Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP). A intenção é que a Justiça Eleitoral passe a rejeitar o registro dos órgãos de direção partidária que deixem de assegurar o mínimo de 30% de mulheres em suas composições. A proposta objetiva reduzir a vergonhosa desigualdade de gênero na política brasileira.

Apresentada há mais de dois anos, a consulta contou com o apoio de mais de 15 entidades da sociedade civil bastante representativas, dentre as quais o Observatório Constitucional Latino-Americano (OCLA), o Instituto de Direito Eleitoral e Público de Pernambuco, o Parlamento do Mercosul, a Confederação Nacional dos Municípios e o Elas Pedem Vista. É essencial, assim, que o TSE delibere sobre o tema. O acolhimento do pedido não violará a autonomia dos partidos políticos. Primeiro, porque a autonomia partidária está limitada pelo princípio democrático e a qualidade da democracia é medida atualmente pela participação política de todos os cidadãos.

Segundo, porque as agremiações, embora pessoas jurídicas de direito privado, estão submetidas aos direitos fundamentais, nos quais se inclui o direito à igualdade de gênero. Os direitos fundamentais também são direcionados à proteção dos particulares em face dos poderes privados diante da sua eficácia horizontal, especialmente em relação aos partidos políticos, que estão umbilicalmente ligados ao adequado funcionamento do processo democrático, possuem o monopólio das candidaturas e administram significativos recursos públicos. Terceiro, porque a fixação de cotas de gênero no âmbito intrapartidário não excluirá, das agremiações, ampla liberdade nas escolhas sobre formas, prazos e requisitos dos candidatos nas eleições internas.

Lembramos ainda que o parâmetro mínimo de 30% de candidaturas proporcionais de cada gênero foi estabelecido em lei, ou seja, a Justiça Eleitoral não criará parâmetro novo. Esse mesmo percentual foi aplicado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) ao garantir o mínimo de recursos públicos nas campanhas femininas, proporcionais ou majoritárias. E o percentual mínimo de candidaturas de gênero – criado pelo legislador, repita-se – não é apenas formal, exige também isonomia material. Nesse ponto, deve-se ressaltar que são as direções partidárias que decidem sobre a divisão e forma de aplicação dos recursos e do tempo de televisão e rádio, estratégias de campanhas eleitorais, mobilização da militância, utilização das estruturas partidárias, etc. Os laranjais orquestrados pelas cúpulas partidárias nas últimas eleições apenas reforçam a constatação de que a garantia formal de recursos para as campanhas femininas não é suficiente para cumprir a exigência legal da igualdade de gênero das candidaturas.

Portanto, o cumprimento da exigência legal de candidaturas femininas tem como condição a participação das mulheres, no mesmo percentual mínimo, nas cadeiras decisórias dos partidos políticos ou, ao menos, nas candidaturas para os cargos de direção partidária, em simetria ao que já foi estabelecido em lei. O pedido apresentado ao TSE mostra-se, assim, adequado, necessário e proporcional para garantir o direito à igualdade de gênero na política.

Dessa forma, solicitamos ao Tribunal Superior Eleitoral que julgue a consulta n. 0603816-39.2017.6.00.0000, ao tempo em que reiteramos a nossa absoluta convicção sobre a correção jurídica da solução que estabeleça a participação mínima das mulheres nos órgãos de direção partidária ou nas candidaturas para esses cargos.

Brasília, 8 de março de 2020.

Délio Lins e Silva Júnior
Presidente da OAB/DF

Rafael Alencar de Araripe Carneiro
Presidente da Comissão de Direito Eleitoral da OAB/DF

 

Imagem do destaque: Tony Winston/Agência Brasília (foto tirada em 14 de setembro de 2016)